1
Trabalho de Conclusão de Curso
ÚLCERAS BUCAIS RELACIONADAS ÀS PRINCIPAIS DESORDENS SISTÊMICAS Débora Julite Poffo
Universidade Federal de Santa Catarina Curso de Graduação em Odontologia
2
3
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA DEPARTAMENTO DE ODONTOLOGIA
Débora Julite Poffo
ÚLCERAS BUCAIS RELACIONADAS ÀS PRINCIPAIS DESORDENS SISTÊMICAS
Trabalho apresentado à Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito para a conclusão do Curso de Graduação em Odontologia. Orientador: Prof. Dr. Filipe Modolo Siqueira Co-orientadora: Alessandra R. Camargo
Florianópolis 2012
4
5
Débora Julite Poffo
ÚLCERAS BUCAIS RELACIONADAS ÀS PRINCIPAIS DESORDENS SISTÊMICAS
Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado para obtenção do título de cirurgião-dentista e aprovado em sua forma final pelo Departamento de Odontologia da Universidade Federal de Santa Catarina.
Florianópolis, 18 de outubro de 2012. Banca Examinadora: ________________________ Prof., Dr. Filipe Modolo Siqueira, Orientador Universidade Federal de Santa Catarina ________________________ Prof.ª, Dr.ª Inês Beatriz da Silva Rath, Universidade Federal de Santa Catarina ________________________ Prof., Dr. Nelson Mackoviecky, Universidade Federal de Santa Catarina
6
7
DEDICATÓRIA
A meus pais, que tornaram esse processo possível, ao me incentivarem e me darem condições de estudar e terminar o curso de graduação em Odontologia na UFSC. A meu namorado, co-autor, editor, programador, por me estimular e ajudar a terminar esse trabalho. Sem você, eu não teria conseguido! De verdade!!!! Você, sem dúvidas, é o amor da minha vida!!!
8
9
AGRADECIMENTOS À Deus, por sempre iluminar meu caminho e me conceder o dom da curiosidade, que me faz buscar diariamente por mais conhecimento. A meu namorado, Francly J. Cuprinski, pelo companheirismo a qualquer hora do dia e da noite, pelo ombro amigo e amparador nos momentos que parecia que não havia resposta às perguntas, pelo apoio e incentivo durante todo o percurso percorrido durante a faculdade. Você, com certeza, torna meus dias muito mais felizes. Com você, descobri o que é a verdadeira felicidade. Te amo!! A meus pais, Rosangela da Silva Poffo e Miguel Diógenes Poffo, que sempre me incentivaram e estimularam a buscar conhecimento e a melhorar mais e mais a cada dia. Vocês tornaram tudo isso possível. Obrigada! Amo vocês. A meus irmãos, Jessé Marcos Poffo e Josué Diógenes Poffo, que mesmo sem nada saberem sobre úlcera, sempre perguntavam se podiam me ajudar com o trabalho. Vocês são parte de mim. Amo demais cada um de vocês! A meu superorientador, Filipe Modolo Siqueira, por ser amigo acima de tudo. Eu não poderia ter escolhido uma pessoa melhor para me ajudar nesse processo. Muito obrigada por toda ajuda! A minha dupla, Gabriela Krusser Rossi, pela torcida. Você se tornou uma amiga em meio às turbulências e, com seu jeito doce, conquistou minha profunda admiração. Adoro você! A todos que de alguma forma contribuíram para minha formação e tornaram esse processo mais fácil e prazeroso. Obrigada!!
10
11
“A mente que se abre a uma nova ideia jamais voltará ao seu tamanho original.” (Albert Einstein)
12
13
RESUMO O cirurgião-dentista, ao analisar e tentar diagnosticar uma condição ulcerativa bucal, depara-se com o fato de que diversas desordens sistêmicas podem ocasioná-las. Vários aspectos devem ser analisados para que o processo diagnóstico seja devidamente conduzido e a melhor abordagem terapêutica seja adotada. Características como a história e o comportamento das lesões, a relação com aparecimento de outras lesões no mesmo ou em outros sítios e a presença de manifestações sistêmicas podem indicar uma possível origem sistêmica do aparecimento dessas lesões em boca. Vale ressaltar que é de extrema importância que o diagnóstico seja realizado o mais precocemente possível, pois muitas das condições ulcerativas presentes em boca decorrentes de desordens sistêmicas antecedem manifestações sistêmicas mais graves. Palavras-chave: Condições ulcerativas bucais, desordens sistêmicas, úlceras bucais, ulcerações bucais, diagnóstico.
14
15
ABSTRACT Several systemic disorders may cause bucal ulcerative conditions, which the dentist needs to analyze and diagnose. Several aspects should be analyzed to conduct properly the diagnostic process and to adopt the best approach. Features like the history and behavior of the lesions, compared with the appearance of other lesions in the same or other sites and presence of systemic manifestations may indicate a possible source of systemic appearance of these lesions in the mouth. It is extremely important to make the diagnostic as early as possible, because many ulcerative conditions present in mouth are due to systemic disorders and precede more severe systemic manifestations. Keywords: Bucal ulcerative conditions, systemic disorders, mouth ulcers, mouth ulcers, diagnosis.
16
17
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS UAR – Úlcera Aftosa Recorrente PV – Pênfigo Vulgar PC – Penfigóide Cicatricial LPO – Líquen Plano Bucal LPE – Líquen Plano Erosivo DC – Doença Celíaca HSV – Herpes Simples Virus GEHA – Gengivoestomatite Herpética Aguda VZV – Varicela Zoster Virus HIV – Virus da Imunodeficiência Humana AIDS – Síndrome da imunodeficiência adquirida DST – Doença Sexualmente Transmissível LCR – Líquido Celafolorraquidiano TB – Tuberculose CMV – Citomegalo Virus EBV – Epstein-Barr Virus HPV – Papiloma Virus Humano
18
19
LISTA DE QUADROS
Quadro 1- Características clínicas dos diferentes tipos de UAR Quadro 2- Classificação de pacientes HIV com base nos achados clínicos e contagem de células CD4+ Quadro 3- Estágio clínico de HIV/AIDS em adolescentes e adultos de acordo com sintomas clínicos Quadro 4- Tratamento da sífilis com base no estadiamento da doença
20
21
LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Ulceração traumática em língua Figura 2 - Ulceração causada por injúria elétrica Figura 3 - Ulceração química por nitrato de prata Figura 4 - Úlcera em língua - Carcinoma espinocelular Figura 5 - Úlcera aftosa recorrente menor Figura 6 – Úlcera aftosa recorrente menor Figura 7 - Úlcera aftosa recorrente maior Figura 8 - Úlcera aftosa maior em palato mole Figura 9 - Múltiplas úlceras herpetiformes em língua Figura 10 - Pênfigo vulgar: Úlcerações irregulares e extensas envolvendo o soalho da boca e o ventre da língua Figura 11 - Penfigóide cicatricial – erosões graves no palato Figura 12 - Penfigoide cicatricial – ulcerações bucais extensas e irregulares Figura 13 - Líquen plano erosivo - Úlcera em mucosa jugal Figura 14 - GEHA - Múltiplas ulcerações em dorso de língua Figura 15 - Herpes simples - Ulceração em região perilabial Figura 16 - Numerosas vesículas branco-opacas em mucosa jugal Figura 17 - Herpangina - Múltiplas ulcerações rasas em palato Figura 18 - Infecção pelo HIV - Lesões de herpes recorrente em palato Figura 19 - Sífilis primária - Dois cancros em dorso de língua Figura 20 - Sífilis secundária - Pápulas sifilíticas em pele Figura 21 - Sífilis secundária - Placas mucosas em mucosa jugal e lábio Figura 22 - Sífilis terciária - Perfuração do palato duro Figura 23 – Tuberculose – Úlcera em dorso de língua Figura 24 - Tuberculose – Úlcera em mucosa jugal
22
Figura 25 – Infecção por HIV – Herpes simples em palato Figura 26 - Infecção por HIV - Úlcera aftosa recorrente em lábio Figura 27 - Infecção por HIV - Ulceração herpética recorrente Figura 28 - Infecção por HIV - Ulceração aftosa recorrente Figura 29 - Paracoccidioidomicose - Úlcera irregular em lábio inferior .
23
SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO...............................................................................................27 1.1 OBJETIVOS................................................................................................ 29 1.1.1 Objetivo Geral............................................................................................29 1.1.2 Objetivos Específicos.................................................................................29 2 REVISÃO DA LITERATURA..........................................................................31 2.1 CLASSIFICAÇÃO E CARACTERÍSTICAS DAS ÚLCERAS.........................31 2.1.1 ÚLCERA x ULCERAÇÕES.......................................................................31 2.2 ULCERAÇÕES RELACIONADAS A TRAUMATISMOS..............................32 2.3 ÚLCERAS RELACIONADAS A CARCINOMAS EPIDERMÓIDES DA CAVIDADE BUCAL.........................................................................................33 2.4 ÚLCERAS RELACIONADAS A CONDIÇÕES SISTÊMICAS.......................35 2.4.1 ÚLCERAS BUCAIS DE ORIGEM IDIOPÁTICA..........................................35 2.4.1.1 ÚLCERA AFTOSA RECORRENTE (UAR).................................................35 2.4.1.1.1 ÚLCERAS AFTOSAS RECORRENTES MENORES..............................37 2.4.1.1.2 ÚLCERAS AFTOSAS RECORRENTES MAIORES...............................38 2.4.1.1.3 ÚLCERAS HERPETIFORMES.................................................................39 2.4.2 ÚLCERAS RELACIONADAS A DOENÇAS DERMATOLÓGICAS..........41 2.4.2.1 PÊNFIGO........................................................................................................41 2.4.2.2 PÊNFIGO VULGAR (PV)..............................................................................42 2.4.2.3 PÊNFIGÓIDE CICATRICIAL.......................................................................45 2.4.2.4 LÍQUEN PLANO............................................................................................48 2.4.3 ÚLCERAS RELACIONADAS A DOENÇAS HEMATOLÓGICAS.............52 2.4.3.1 ANEMIAS.......................................................................................................52 2.4.3.1.1 ANEMIA POR DEFICIÊNCIA DE FERRO.............................................52 2.4.3.1.2 ANEMIA APLÁSICA................................................................................54 2.4.4ÚLCERAS RELACIONADAS A DOENÇAS GASTROINTESTINAIS........55 2.4.4.1 DOENÇA CELÍACA......................................................................................55 2.4.5
ÚLCERAS
BUCAIS
RELACIONADAS
A
DOENÇAS
INFECTOCONTAGIOSAS...................................................................................57 2.4.5.1 DOENÇAS VIRAIS........................................................................................57
24
2.4.5.1.1 HERPES SIMPLES....................................................................................57 2.4.5.1.2 CATAPORA/VARICELA..........................................................................61 2.4.5.1.2.1 VARICELA............................................................................................. 61 2.4.5.1.2 VARICELA ZOSTER................................................................................62 2.4.5.1.3 HERPANGINA...........................................................................................63 2.4.5.1.4 HIV.............................................................................................................65 2.4.5.1.4.1 CONDIÇÕES SISTÊMICAS FORTEMENTE ASSOCIADAS AO HIV............................................................................................................. ...............69 2.4.5.1.4.1.1 DOENÇAS BACTERIANAS...............................................................69 2.4.5.1.4.1.1.1 SÍFILIS.............................................................................................. 69 2.4.5.1.4.1.1.2 SÍFILIS EM PACIENTES HIV.........................................................75 2.4.5.1.4.1.2 TUBERCULOSE..................................................................................76 2.4.5.1.4.1.2.1 TUBERCULOSE EM PACIENTES HIV.........................................80 2.4.5.1.4.2 DOENÇAS VIRAIS EM PACIENTES HIV...........................................80 2.4.5.1.4.3 ULCERAÇÕES NÃO-ESPECÍFICAS EM PACIENTES HIV..............82 2.4.5.1.4.3.1 ÚLCERAS AFTOSAS EM PACIENTES HIV....................................82 2.4.5.2 DOENÇAS FÚNGICAS.................................................................................84 2.4.5.2.1 PARACOCCIDIOIDOMICOSE................................................................84 3 DISCUSSÃO...................................................................................................88 3.1
DIAGNÓSTICO
BASEADO
NO
NÚMERO
DE
CONDIÇÕES
ULCERATIVAS.................................................................................................88 3.1.1 ULCERAÇÃO...........................................................................................89 3.1.1.1 ULCERAÇÃO ÚNICA...................................................................................89 3.1.1.1.1 ULCERAÇÃO ÚNICA COM AUSÊNCIA DE FEBRE...........................88 3.1.1.1.1.1 ULCERAÇÃO ÚNICA RELACIONADA AO TRAUMATISMO........88 3.1.1.1.1.2 ÚLCERAS AFTOSAS RECORRENTES (UAR)...................................88 3.1.1.1.1.3 ULCERAÇÃO ÚNICA RELACIONADA À SÍFILIS PRIMÁRIA.......89 3.1.1.1.2 ULCERAÇÃO ÚNICA COM PRESENÇA DE FEBRE...........................90 3.1.1.1.2.1 ULCERAÇÃO ÚNICA RELACIONADA AO HERPES SIMPLES......90 3.1.2 ÚLCERA...................................................................................................91 3.1.2.1 ÚLCERA ÚNICA............................................................................................91 3.1.2.1.1 ÚLCERA ÚNICA COM AUSÊNCIA DE FEBRE....................................91
25
3.1.2.1.1.1 ÚLCERA ÚNICA RELATIVA À CEC EM ESTÁGIO INICIAL.........91 3.1.2.1.2 ÚLCERA ÚNICA COM PRESENÇA DE FEBRE....................................92 3.1.2.1.2.1 ÚLCERA ÚNICA RELACIONADA À PARACOCCIDIOIDOMICOSE 92 3.1.2.1.2.2 ÚLCERA ÚNICA RELACIONADA À TUBERCULOSE.....................92 3.1.2.2 ÚLCERAS/ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS....................................................93 3.1.2.2.1 ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS...................................................................94 3.1.2.2.1.1 ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS DE CURSO CLÍNICO AGUDO...........94 3.1.2.2.1.1.1 ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS RELACIONADAS A GENGIVOESTOMATITE HERPÉTICA AGUDA (GEHA)...................................94 3.1.2.2.1.1.2 ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS RELACIONADAS A VARICELA ZOSTER...................................................................................................... ..............95 3.1.2.2.1.1.3 ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS RELACIONADAS A HERPANGINA..........................................................................................................95 3.1.2.2.1.1.4 ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS RELACIONADAS À SÍFILIS SECUNDÁRIA..........................................................................................................96 3.1.2.2.1.2 ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS DE CURSO CLÍNICO RECIDIVANTE 97 3.1.2.2.1.2.1 UAR......................................................................................................97 3.1.2.2.1.2.1.1 MÚLTIPLAS UAR E DOENÇA CELÍACA (DC)...........................97 3.1.2.2.1.2.1.2 MÚLTIPLAS UAR E HIV................................................................98 3.1.2.2.1.2.1.3 MÚLTIPLAS UAR RELACIONADAS À ANEMIA POR DEFICIÊNCIA DE FERRO......................................................................................99 3.1.2.2.1.2.2 ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS RELACIONADAS AO HERPES SIMPLES...................................................................................................................99 3.1.2.2.2 ÚLCERAS MÚLTIPLAS.........................................................................100 3.1.2.2.2.1 ÚLCERAS MÚLTIPLAS DE CURSO CLÍNICO CRÔNICO.............100 3.1.2.2.2.1.1 ÚLCERAS MÚLTIPLAS RELACIONADAS AO PÊNFIGO VULGAR.................................................................................................................100 3.1.2.2.2.1.2 ÚLCERAS MÚLTIPLAS RELACIONADAS AO PENFIGÓIDE CICATRICIAL........................................................................................................101
26
3.1.2.2.2.1.3 ÚLCERAS MÚLTIPLAS RELACIONADAS AO LÍQUEN PLANO EROSIVO................................................................................................................102 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................105 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS…………………………….......………...108
27
1 INTRODUÇÃO Diversas desordens sistêmicas podem ter como sítio de manifestação a cavidade bucal, sendo que em diversas situações, estas manifestações poderão preceder os sinais e sintomas sistêmicos da doença. Este fato aumenta a responsabilidade de profissionais da área odontológica, que devem estar preparados para reconhecer tais doenças e, consequentemente, viabilizar seu diagnóstico. A literatura científica aponta diversas alterações sistêmicas que podem ser comumente relacionadas a manifestações bucais, tais como sífilis, tuberculose, doença de Crohn, anemias, neutropenias e AIDS, entre outras. Vale à pena salientar que algumas delas, quando diagnosticadas precocemente, podem ter sua morbidade diminuída e, consequentemente, melhorar a qualidade de vida de pacientes afetados. O processo diagnóstico, a condução do caso e a abordagem terapêutica a serem adotadas dependerão, em grande proporção, da propedêutica clínica do profissional responsável pelo paciente. Desta forma, o cirurgião-dentista deve estar atento às lesões bucais e suas características clínicas, que podem ser relacionadas não só a problemas locais, mas também à distúrbios sistêmicos. É nesse contexto que se destacam as úlceras bucais, lesões comumente encontradas na prática odontológica, cujo diagnóstico pode se tornar um desafio frente à diversidade de causas. A maioria dessas lesões apresenta como agente etiológico fatores locais como traumatismos mecânicos, físicos ou térmicos. Entretanto, uma investigação mais detalhada deve ser realizada quando a remoção dos agentes etiológicos não levar à remissão dessas lesões em um período de até 3 semanas, sendo então consideradas lesões persistentes. Novas medidas devem ser adotadas e a possibilidade de associação com doenças sistêmicas deve ser considerada (LEÃO et al, 2007; SCULLY et al, 2008). Úlcera bucal é definida como uma violação do epitélio bucal, que expõe terminações nervosas na base do epitélio. Geralmente possui coloração amarelo-acinzentada e, eventualmente, halo eritematoso (ABDOLLAHI et al, 2008; SCULLY et al, 2008). Devido às lesões ulceradas possuírem aspectos clínicos muito semelhantes, informações relacionadas à sua etiologia e evolução são de suma importância para delinear o raciocínio diagnóstico (REGEZI et al, 2008). Úlceras precedidas por lesões vesículo-bolhosas, por exemplo, podem ser encontradas em condições como doenças dermatológicas, sífilis
28
secundária e colite ulcerativa (REGEZI et al, 2008; SCULLY et al, 2008). Para condução do raciocínio diagnóstico acerca das úlceras, o dado inicial a ser observado é a presença de lesões únicas ou múltiplas (SCULLY et al, 2009). Lesões únicas e persistentes podem ser indicativas de condições crônicas como traumatismo, neoplasias como carcinoma epidermóide, doenças autoimunes como pênfigo, ou doenças infecciosas como sífilis, tuberculose ou paracoccidioidomicose (SCULLY et al, 2009). Já ulcerações múltiplas persistentes podem ser relacionadas a doenças sistêmicas como doenças sanguíneas, doenças autoimunes, doenças gastrointestinais e doenças infecciosas (SCULLY et al, 2009). Este trabalho revisará as principais condições sistêmicas que podem gerar úlceras únicas ou múltiplas, sendo divididas em: Doenças idiopáticas – Úlcera aftosa recorrente (UAR). Doenças dermatológicas – pênfigo vulgar, penfigóide cicatricial, líquen plano bucal; Doenças Hematológicas – anemia aplásica, anemia ferropriva; Doenças gastrointestinais – doença celíaca; Doenças Infectocontagiosas virais – herpes simples, catapora/varicela, herpangina, síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS); Doenças Infectocontagiosas bacterianas – sífilis, tuberculose; Doenças Infectocontagiosas Fúngicas – paracoccidioidomicose;
29
1.1
OBJETIVOS
1.1.1
Objetivo Geral
Correlacionar a presença de úlceras bucais com a sua possível causa sistêmica. 1.1.2
Objetivos Específicos
Associar a presença de lesões bucais ulcerativas a diversas desordens sistêmicas; Revisar de forma sucinta as doenças sistêmicas mais freqüentes que levam à formação de úlceras bucais.
30
31
2 REVISÃO DA LITERATURA 2.1 2.1.1
CLASSIFICAÇÃO E CARACTERÍSTICAS DAS ÚLCERAS Úlcera x Ulcerações
Ulceração é definida como uma violação do epitélio bucal, que deixa exposta terminações nervosas na lâmina própria. Na literatura observa-se uma diferenciação entre os termos úlcera e ulceração. São denominadas úlceras as lesões de caráter crônico, que persistem por semanas e/ou meses, como as decorrentes de neoplasias malignas, sífilis secundária, pênfigo vulgar e outras. Denominam-se ulcerações as lesões de curta duração, geralmente decorrentes de doenças autolimitantes, como UAR, herpes recorrente, lesões traumáticas e outras (ABDOLLAHI et al, 2008; SCULLY et al, 2009). As úlceras podem ser subclassificadas de acordo com sua etiologia em: a. Úlceras primárias: lesões decorrentes de agentes causadores locais como medicamentos retidos na cavidade bucal, radiação, antissépticos e traumatismo entre outros (ABDOLLAHI et al, 2008; SCULLY et al, 2009). b. Úlceras secundárias: lesões decorrentes da evolução de outras lesões primitivas como bolhas, vesículas e nódulos (ABDOLLAHI et al, 2008; SCULLY et al, 2009). De acordo com seu aspecto neoplásico em benignas ou malignas (SALCEDO; MARTÍNEZ, 2010): a. Úlceras de caráter benigno: geralmente apresentam evolução lenta, são dolorosas e com pouco sangramento. Caracterizam-se por serem de profundidade rasa, com leito liso, limites e bordas nítidos, forma arredondada, base não-endurecida e com presença de halo eritematoso (SALCEDO; MARTÍNEZ, 2010; SBC, 2012); b. Úlceras de aspecto maligno: geralmente apresentam evolução rápida, com aspecto destrutivo, são inicialmente indolores e sangram facilmente. Caracterizam-se por serem de profundidade rasa ou profunda, infiltrativas, de leito com vegetação necrótica, com limites nítidos ou imprecisos, com bordas nítidas ou imprecisas, base endurecida e sem halo eritematoso (SALCEDO; MARTÍNEZ, 2010; SBC, 2012). As úlceras e ulcerações apresentam uma série de aspectos semiológicos que devem ser minuciosamente considerados com vista à
32
formulação de hipóteses diagnósticas. Assim, a forma, localização, cor, tamanho, aspecto das bordas e da base da lesão, profundidade, consistência à palpação, sensibilidade dolorosa, aderência a planos profundos, número de lesões, fenômenos sistêmicos associados, duração, ocorrência de fatos prévios à sua instalação e história de episódios anteriores semelhantes e recorrência poderão ser de grande importância na elaboração do diagnóstico (SCULLY et al, 2009; RAPOPORT et al, 2001). Ao iniciar o raciocínio diagnóstico o clínico deve constatar se a lesão ulcerativa bucal é resultado de traumatismos mecânico, térmico ou químico (LEÃO et al, 2007). 2.2
ULCERAÇÕES RELACIONADAS A TRAUMATISMOS
Ulcerações de caráter traumático da cavidade bucal apresentam sinais e sintomas clínicos de inflamação aguda. Clinicamente apresentam-se cobertas por um exsudato amarelo-esbranquiçado, circundadas por um halo eritematoso. Em decorrência das lesões, o paciente relata dor e sensibilidade em variados graus de intensidade (REGEZI et al, 2008). A maioria dos traumatismos é causada simplesmente por um estímulo mecânico e, em geral, a relação de causa e efeito é óbvia (REGEZI et al, 2008). O trauma mecânico geralmente ocorre em regiões como lábio inferior, língua e mucosa jugal (Fig.1), que podem ser traumatizadas durante a mastigação, fala ou mesmo durante o sono (REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009).
Figura 1 – Ulceração traumática em língua Fonte: Laskaris et al. 2004.
33
Algumas condições ulcerativas autoinduzidas são clinicamente óbvias, porém outras podem ser sutis e difíceis de serem diagnosticadas (REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). Próteses totais mucossuportadas mal adaptadas são frequentes causas de ulcerações traumáticas na cavidade bucal. Associado a isso, em pacientes com reduzido fluxo salivar (hipossalivação), tem-se a diminuição da retenção das próteses, aumentando o aparecimento dessas lesões. Os sítios mais afetados, nesses casos, são a língua, a mucosa jugal e o lábio inferior, geralmente associados à queixa de dor durante a mastigação (GOIATO et al, 2005; PARANHOS et al, 2008). O tratamento ortodôntico também está relacionado à presença de ulcerações traumáticas bucais. Em um estudo realizado por Kvam et al. (1987) apud Lima et al. (2005), foi constatado que 75,8% dos pacientes em tratamento ortodôntico apresentavam ulcerações traumáticas na mucosa bucal (LIMA et al, 2005). Injúrias elétricas (Fig.2), térmicas e químicas (Fig.3) geralmente são mais fáceis de serem identificadas, pois o paciente relatará o acidente ou a administração de substâncias químicas previamente ao aparecimento das lesões. Em muitos casos de injúria química o paciente não será capaz de identificar a substância que causou a ulceração. É papel do cirurgião-dentista, durante a anamnese, questionar se o paciente teve contanto com substâncias como aspirina, perborato de sódio, peróxido de hidrogênio, gasolina, ácido de bateria dentre outras (REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009).
Figura 2 – Ulceração causada por injúria elétrica Fonte: Laskaris et al. 2004.
34
Figura 3 - Ulceração química por nitrato de prata Fonte: Laskaris et al. 2004.
Descartada a hipótese de iatrogenia profissional e relação de causa e efeito com traumatismo, devem-se investigar outros possíveis fatores etiológicos. Condições ulcerativas bucais relacionadas a trauma desaparecem cerca de 1 semana após a remoção da causa. Fato esse que direciona o diagnóstico, em caso de não remissão, a uma etiologia que não o trauma (SCULLY; SHOTTS, 2001; SCULLY et al, 2008 ). Lesões ulcerativas persistentes e/ou refratárias podem ser indicativas de 1) neoplasias ou 2) condições sistêmicas crônicas (SCULLY et al, 2008). 2.3
ÚLCERAS RELACIONADAS A CARCINOMAS EPIDERMÓIDES DA CAVIDADE BUCAL
Os carcinomas epidermóides ou espinocelular (Fig.4) da cavidade bucal geralmente atingem homens na meia idade e podem apresentar-se como úlceras que, por provocarem pouca ou nenhuma dor nos estágios iniciais, geralmente passam despercebidas. Estão altamente relacionadas a fatores de risco como consumo de tabaco e etilismo; além de baixo consumo de caroteno e história familiar prévia de câncer (RAPOPORT et al, 2001; NEVILLE et al, 2009). Clinicamente apresentam caráter maligno, com uma região central ulcerada, irregular e deprimida, com uma borda circundante elevada e coloração que varia do vermelho ao branco. 40% dos casos de carcinoma de boca localizam-se em língua, sendo que a região lateral posterior de língua é a mais acometida. Outras regiões mais afetadas são assoalho de boca e lábio inferior (NEVILLE; DAY, 2002; NEVILLE et al, 2009).
35
Figura 4 - Úlcera em língua - Carcinoma espinocelular Fonte: Laskaris et al. 2004.
2.4
ÚLCERAS RELACIONADAS A CONDIÇÕES SISTÊMICAS
Condições sistêmicas crônicas como doenças dermatológicas, gastrointestinais, autoimunes e infecciosas também podem manifestar-se a partir de úlceras múltiplas e persistentes de caráter benigno, sendo necessários conhecimento das doenças e uma avaliação minuciosa para realização de um correto diagnóstico (SCULLY et al, 2009). É importante que se faça um diagnóstico preciso e precoce tanto de neoplasias da cavidade bucal como de doenças sistêmicas, sendo essa uma etapa imperativa para a realização de um tratamento eficaz. Lesões que não regridem em 2 a 3 semanas requerem intensa investigação e, caso necessário, deve-se realizar biópsia para definição do quadro. 2.4.1
ÚLCERAS BUCAIS DE ORIGEM IDIOPÁTICA
2.4.1.1 ÚLCERA AFTOSA RECORRENTE (UAR) Uma das condições patológicas bucais mais frequentes é a UAR, afetando cerca de 20% da população mundial. Manifesta-se geralmente em mulheres entre 10 e 19 anos, podendo ter episódios de recorrência por toda a vida. Sua causa ainda permanece desconhecida, porém está relacionada a fatores genéticos, locais, sistêmicos, nutricionais e imunopatológicos (BARRONS et al, 2001; LASKARIS et al, 2004; GUIMARÃES et al, 2005; PEREIRA et al, 2006; CURVELO et al, 2005; WILHEMSEM et al, 2009; SILVA et al, 2011).
36
Em um estudo realizado por Ship et al (1972) apud Guimarães et al (2005), concluiu-se que crianças cujos pais apresentaram na infância episódios de UAR tinham 90% probabilidade de desenvolver essa condição; enquanto crianças sem esse fator genético tinham apenas 20%. Além disso, pacientes com histórico familiar de UAR podem desenvolver úlceras mais cedo e em manifestações mais severas do que aquelas sem histórico prévio da doença (GUIMARÃES et al, 2005; WILHEMSEM et al, 2009). Hábitos como mordiscar os lábios ou a mucosa jugal são os principais traumas físicos que desencadeiam UAR. Os pacientes referem como as causas mais comuns a escovação, o fio dental, a goma de mascar, os alimentos com espinhos, a má-oclusão dentária, as injeções e o tratamento odontológico. Para quem já tem suscetibilidade a desenvolver as lesões, esses fatores podem agravar o quadro (FRAIHA et al, 2002; GUIMARÃES et al, 2005). Fatores sistêmicos têm sido fortemente associados ao aparecimento de UAR incluindo a Doença de Behçet, a Doença Celíaca, a Doença de Crohn, a Neutropenia cíclica autoimune, as Deficiências nutricionais (com ou sem origem gastrointestinal) e o imunocomprometimento pelo HIV. Atribui-se o aparecimento das lesões, nas doenças intestinais e deficiências nutricionais gerais, às deficiências nutricionais de Fe, vitaminas B1, B2, B6 e B12 e ácido fólico. Na neutropenia cíclica, atribui-se as lesões às depressões de neutrófilos que ocorrem, geralmente, a cada 3 semanas (LASKARIS et al, 2004; FAVARO et al, 2005; GREENBERG et al, 2008; REGEZI et al, 2008; SILVA et al, 2011). O estresse tem sido relacionado com o aparecimento de UAR, sendo que em alguns estudos relatam que em períodos de aula houve aumento no aparecimento das UAR em estudantes, enquanto houve sua diminuição em períodos de férias (FAVARO et al, 2005; GUIMARÃES et al, 2005). Sircus et al (1959) relatou que o estresse emocional precede o aparecimento inicial de UAR em 60% dos casos e de recorrências em 21% dos casos. Entretanto, não há consenso na literatura quanto à relação entre o estresse e a recorrência de UAR (SIRCUS et al, 1959) O mecanismo imunológico é o mais aceito. Acredita-se que a etiologia das lesões possa envolver citotoxidade celular anticorpodependente mediada por linfócitos T. O estímulo da destruição imunomediada pode ser qualquer um dos fatores citados anteriormente (PEREIRA et al, 2006; WILHEMSEM et al, 2009). As UAR podem apresentar-se clinicamente de três formas: úlcera aftosa menor, úlcera aftosa maior e úlcera herpetiforme. As diferenças
37
são essencialmente relacionadas ao grau de severidade das lesões. Todas se apresentam com formato circular/oval, rasas e doloridas, sofrendo episódios de recidivas em poucos dias ou meses (FRAIHA et al, 2002; GUIMARÃES et al, 2005; PEREIRA et al, 2006; CURVELO et al, 2005; WILHEMSEM et al, 2009). 2.4.1.1.1
ÚLCERAS AFTOSAS RECORRENTES MENORES
As úlceras aftosas menores (Fig.5 e 6), também conhecidas como UAR de Mickulicz, são as mais freqüentes e afetam aproximadamente 80% dos pacientes com histórico de UAR. Apresentam sinais prodrômicos de 24 a 48 horas antes do seu aparecimento, de prurido, ardência, queimação, dor moderada. O local fica edemaciado e eritematoso. Segue-se o aparecimento de pequenas vesículas que se caracterizam por serem dolorosas, superficiais e pequenas (2 a 6 mm de diâmetro), de formato oval ou arredondada, com limites irregulares, recobertas por uma membrana branco-amarelada de tecido necrosado e circundadas por um halo eritematoso. Podem ser únicas ou múltiplas e persistem por 7 a 14 dias, regredindo espontaneamente sem deixar cicatriz. Localizam-se preferencialmente em mucosa não-ceratinizada mucosa bucal, lábios, língua e fundo de sulco vestibular e, menos comumente, em gengivas e palato. O tempo de recorrência acontece em intervalos de 1 a 5 meses (FRAIHA et al, 2002; LASKARIS et al, 2004; GUIMARÃES et al, 2005; PEREIRA et al, 2006; CURVELO et al, 2005; WILHEMSEM et al, 2009).
Figura 5 - Úlcera aftosa recorrente menor Fonte: Laskaris et al. 2004.
38
Figura 6 - Úlcera aftosa recorrente menor Fonte: Fraiha et al. 2002.
2.4.1.1.2
ÚLCERAS AFTOSAS RECORRENTES MAIORES
A forma maior (Fig.7 e 8), também conhecida com doença de Sutton ou periadenite mucosa necrótica recorrente (PMNR), apresentase clinicamente com sintomatologia mais severa, podendo representar 10% a 15% dos casos de UAR. Caracterizam-se clinicamente por serem maiores que 5mm de diâmetro (podendo exceder os 3 cm). Localizamse preferencialmente em lábios e palato mole. Podem durar até 6 semanas, regredindo espontaneamente e deixando cicatriz (FRAIHA et al, 2002; GUIMARÃES et al, 2005; PEREIRA et al, 2006; CURVELO et al, 2005; WILHEMSEM et al, 2009).
Figura 7 - Úlcera aftosa recorrente maior Fonte: Laskaris et al. 2004.
39
Figura 8 - Úlcera aftosa maior em palato mole Fonte: Laskaris et al. 2004.
2.4.1.1.3
ÚLCERAS HERPETIFORMES
A forma herpetiforme (Fig.9) é mais rara e atinge 5% a 10% dos pacientes com UAR. Caracteriza-se clinicamente por serem puntiformes, múltiplas, pequenas (2mm) e dolorosas, ocorrendo em toda a cavidade bucal. Podem chegar a uma centena ao mesmo tempo. Acometem qualquer região da cavidade bucal, não tendo sítios de predileção específicos. Essas lesões podem coalescer-se produzindo lesões largas e irregulares, que duram de 10 a 30 dias, podendo deixar cicatrizes (FRAIHA et al, 2002; GUIMARÃES et al, 2005; PEREIRA et al, 2006; CURVELO et al, 2005; WILHEMSEM et al, 2009).
Figura 9 - Múltiplas úlceras herpetiformes em língua Fonte: Laskaris et al. 2004.
40
Quadro 1- Características clínicas dos diferentes tipos de UAR
IDADE NÚMERO DE ÚLCERAS TAMANHO DAS ÚLCERAS DURAÇÃO CICATRIZAÇÃ O COM CICATRIZ
UAR MENOR
UAR MAIOR
2a década 1a5
1a e 2a décadas 1a3
UAR HERPETIFORM E 3a década 5 a 20 (100)
< 5 mm
> 5 mm
1 a 2 mm
7 a 14 dias
2 semanas a 3 meses Sim
7 a 14 dias
Não
Mucosa nãoMucosa queratiniza, queratinizada e especialmente nãoSÍTIO mucosa labial queratinizada, e bucal; dorso particularmente e borda lateral palato mole. de língua. Fonte: FIELD; ALLAN, 2003.
Não*
Mucosa nãoqueratinizada, particularmente assoalho de boca e ventre de língua.
Em virtude da diversidade de possíveis fatores etiológicos, ainda não foi definido um tratamento específico para UAR. Deve-se avaliar a severidade das lesões – número, localização, tamanho e duração; bem como seus efeitos no paciente – grau de desconforto, efeito na alimentação e qualidade de vida. Existem várias opções de tratamento, podendo ser administradas medicações voltadas para o alívio da sintomatologia nas formas tópica e sistêmica (FRAIHA et al, 2002; PEREIRA et al, 2006). O tratamento tem quatro principais objetivos: o manejo da úlcera, provendo sua cicatrização e reduzindo a duração; manejo da dor, para reduzir a morbidade e reforçar a função; manejo nutricional, para garantir adequada alimentação e controle da doença, para prevenir recorrência ou reduzir a frequência (PEREIRA et al, 2006). O tratamento inicial consiste no uso de enxaguatórios antimicrobianos com intenção de controlar infecções secundárias e contaminação das lesões. Em três estudos por Barrons et al (2001), realizados não foram encontradas diferenças significativas na redução de severidade e dor com o uso dos antissépticos. Em outros dois estudos
41
por Barrons et al (2001), no entanto, o número de úlceras diminuiu significativamente na presença de enxaguatórios antissépticos (BARRONS et al, 2001). O uso de corticóides tópicos tem a intenção de limitar o processo inflamatório associado à formação das UAR. A administração desses medicamentos pode reduzir significativamente a duração e severidade da dor dessas lesões, porém não altera a freqüência e aparecimento das lesões. Pode-se administrar beclometasona gel ou spray 4 vezes ao dia, de 6 a 30 dia (BARRONS et al, 2001). Em estudos realizados por Barrons et al (2001), concluiu-se que o uso de gluconato de clorexidine solução a 0,1%, 0,2% ou gel a 1% no período de 6 a 8 semanas não gera diferença significativa na duração e severidade da dor das UAR. A quantidade de úlceras, no entanto, foi significativamente menor em pacientes que fizeram seu uso. O uso de bochechos diários de solução de tetraciclina 250mg, 4 vezes ao dia, por 2 minutos, pelo período de 4 a 15 dias ou de betametasona gel ou beclometasona spray 4 vezes ao dia, de 6 dias a 4 semanas, reduz significativamente a duração e severidade da dor das UAR. Com ambos os fármacos, no entanto, não se observou diminuição na frequência de aparecimento das lesões. Pacientes que fizeram uso da solução de tetraciclina por mais de 5 dias relataram efeitos adversos como disgeusia, reações cutâneas, queilite angular, queimação e dor de garganta. Não foi encontrada diferença significativa na duração ou frequência das lesões em pacientes que fizeram uso de adesivo, tablete ou pomada de triancinolona ou betametasona (BARRONS et al, 2001). Antes de qualquer tratamento, no entanto, deve-se avaliar a história médica do paciente, a fim de buscar sinais e sintomas associados a desordens sistêmicas que possam gerar essas úlceras. Condições ulcerativas persistentes e severas geralmente estão associadas a doenças sistêmicas (BARRONS et al, 2001; PEREIRA et al, 2006). 2.4.2
ÚLCERAS RELACIONADAS A DOENÇAS DERMATOLÓGICAS
2.4.2.1 PÊNFIGO Pênfigo é uma doença autoimune resultante da produção de autoanticorpos que reagem com glicoproteínas desmossômicas presentes na superfície celular dos queratinócitos. A resposta imune causa perda da adesão celular, resultando na formação de bolhas
42
intraepiteliais. A condição atinge pele e mucosas com significativo índice de risco de morte e morbidade, causando risco de morte (LASKARIS et al, 2004; GREENBERG et al, 2008; SHAMIM et al, 2008). A maioria dos casos de pênfigo é idiopática. Alguns fatores, no entanto, podem predispor ao aparecimento da doença tais como: medicamentos (captopril e penicilamina), radiação, cirurgia, alguns alimentos (alho) e estresse emocional. Relaciona-se à doença, também, uma base genética bastante forte (SCULLY et al, 2009). Acomete 0,5 a 3,2 a cada 100 mil pessoas, sendo mais prevalente em adultos entre a quinta e a sexta décadas de vida. Miziara et al (2003) acrescenta que a doença mostra-se menos frequente após os 70 anos de idade e em crianças (MIZIARA et al, 2003; GREENBERG et al, 2008; SCULLY et al, 2009) . Em um estudo realizado por Scully e Challacombe em 2002, foi constatado que cerca de 18% dos pacientes de clínicas ambulatoriais dermatológicas apresentavam lesões bucais de pênfigo (SCULLY; CHALLACOMBE, 2002). O pênfigo apresenta-se em diferentes formas, de acordo com a produção de autoanticorpos contra antígenos-alvo da superfície celular, resultando em lesões em diferentes camadas do epitélio. Apresenta-se nas seguintes formas: pênfigo vulgar (PV), pênfigo vegetativo, pênfigo foliáceo, pênfigo eritematoso, pênfigo paraneoplásico (PPN) e pênfigo droga-relacionado. A forma mais importante é o pênfigo vulgar (PV) (Fig.10) que representa cerca de 50% a 80% dos casos e, portanto este será a única forma a ser abordada no trabalho (GREENBERG et al, 2008; SHAMIM et al, 2008). 2.4.2.2 PÊNFIGO VULGAR (PV) PV é a forma mais grave dentre os pênfigos. Geralmente manifesta-se entre a quarta e sexta décadas de vida e acomete mais o sexo feminino, numa proporção de 2:1. Alguns autores, entretanto, afirmam que ambos são acometidos igualmente (WANKE et al, 1990; MIZIARA et al, 2003; GREENBERG et al, 2008; LASKARIS et al, 2004; BERNABÉ et al, 2005; SHAMIM et al, 2008; FIRMINETE et al, 2009; SCULLY et al, 2009). Essa condição acomete pele e mucosas e caracteriza-se pela presença de autoanticorpos IgG contra proteínas desmossômicas – desmogleína 1 e 3 - encontrados nas junções epiteliais dos tecidos de revestimento. A reação imune resulta em acantólise (separação entre as
43
células epiteliais) nas regiões inferiores da camada espinhosa, gerando vesículas intraepiteliais (MIZIARA et al, 2003; GREENBERG et al, 2008; SCULLY et al, 2009; PRADEEP et al, 2009; FIRMINETE et al, 2009; ARMOMINO; BARBOSA, 2010). Qualquer região da pele pode ser afetada, porém as áreas mais envolvidas são tronco, couro cabeludo, umbigo e regiões intertriginosas (LASKARIS et al, 2004). Segundo a literatura, 89% dos pacientes com pênfigo vulgar apresentam lesões bucais durante o curso da doença e alguns autores descrevem que em 40% a 68% dos casos a doença aparece primeiramente em boca, podendo levar de meses a anos para manifestar-se em outros locais (MIZIARA et al, 2003; LASKARIS et al, 2004; BERNABÉ et al, 2005; GREENBERG et al, 2008; FIRMINETE et al, 2009). Clinicamente, a lesão manifesta-se como uma bolha com paredes finas, que se rompe com facilidade e resulta no aparecimento de amplas áreas de desnudamento epitelial (GREENBERG et al, 2008; SHAMIM et al, 2008; FIRMINETE et al, 2009; SCULLY et al, 2009). As lesões bucais manifestam-se inicialmente como bolhas clássicas, sem halo eritematoso e que raramente são vistas, pois se rompem rapidamente. O achado mais comum são úlceras rasas, dolorosas, com limites irregulares, que podem estender-se envolvendo grande parte da mucosa bucal. Mostram pouca evidência de cura, mesmo quando as lesões cutâneas estão controladas pelo tratamento. Os locais mais acometidos são as regiões de trauma como palato mole, gengiva, lábio inferior e mucosa bucal; sendo as mais comuns, palato e gengiva. Um sintoma normalmente associado às úlceras é a disfagia (LASKARIS et al, 2004; BERNABÉ et al, 2005; GREENBERG et al, 2008; SHAMIM et al, 2008; PRADEEP et al, 2009; FIRMINETE et al, 2009; SCULLY et al, 2009).
44
Figura 10 - Pênfigo vulgar: Úlcerações irregulares e extensas envolvendo o soalho da boca e o ventre da língua Fonte: Neville et al. 2009.
O tratamento deve ser instituído imediatamente por um médico experiente em terapia imunossupressora e, se possível, antes do aparecimento das lesões cutâneas. Consiste no uso de altas doses de corticosteróides sistêmicos, objetivando eliminar as lesões. Após a estabilização do quadro, opta-se pela diminuição das doses na tentativa de controlar a doença. As lesões bucais são de difícil resolução, sendo descritas na literatura como “as primeiras a chegarem e as últimas a saírem” (BERNABÉ et al, 2005; SCULLY et al, 2009; FIRMINETE et al, 2009; NEVILLE et al, 2009; Armomino, 2010). Dentre os corticosteróides, a terapia sistêmica com prednisolona 60mg/dia em dose única pela manhã é preconizada. Com o controle da doença, a dose de prednisolona pode ser diminuída ou associada à medicamentos adjuvantes ou alternativos, tais como a azatioprina, a ciclosporina, a ciclofosfamida; e outros como: o ouro, a dapsona, o clorambucil, o levamisol e as imunoglobulinas. Quando forem constatadas apenas lesões bucais localizadas, corticosteróides tópicos ou aplicados intralesionalmente, também podem ser eficazes por um período de tempo, como terapia adjuvante (REGEZI et al, 2008; SCULLY et al, 2009). No entanto, o uso de corticosteróides por longos períodos pode gerar efeitos adversos como: diabete melito; supressão da glândula adrenal, ganho de peso, osteoporose, úlceras pépticas, oscilações do estado de humor e susceptibilidade aumentada para o desenvolvimento de uma grande quantidade de infecções (NEVILLE et al, 2009; SCULLY et al, 2009).
45
É possível ocorrer remissão total e duradoura na maioria dos pacientes, permitindo que a terapia sistêmica seja suspensa com segurança sem uma recaída na atividade da doença. A remissão ocorre em, aproximadamente, 75% dos pacientes após 10 anos de terapia (SCULLY et al, 2009). O sucesso pode ser monitorado pela mensuração dos títulos de autoanticorpos circulantes usando a imunofluorescência direta (REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009; ARMOMINO et al, 2010).
2.4.2.3 PÊNFIGÓIDE CICATRICIAL O penfigóide cicatricial (PC) (Fig.11 e 12), assim com o pênfigo vulgar (PV), caracteriza-se por uma doença bolhosa autoimune, de caráter crônico e grave, em que autoanticorpos unem-se a componentes da membrana basal, gerando vesículas ou bolhas subepiteliais em mucosas e, ocasionalmente, em pele, que ao romperem-se, formam úlceras dolorosas e persistentes (LASKARIS et al, 2004; BONISSON et al, 2007; FREITAS et al, 2008; REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). Acredita-se que formação de bolhas com localização subepitelial produza um teto mais espesso e resistente e, portanto, vesículas ou bolhas mais duradouras do que a bolha intraepitelial do PV (REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). O sufixo “óide” é acrescentado na denominação dessa doença, pois há semelhança clínica com o PV, entretanto, as características microscópicas e o prognóstico são muito diferentes (NEVILLE et al, 2009). A lesão primária do PC tem origem heterogênea e ocorre devido à produção de imunoglobulinas e componentes do complemento (C3) que se depositam em qualquer um dos vários componentes da membrana basal, gerando uma divisão entre epitélio e lâmina própria e subsequente formação de vesículas (YAMAMOTO; PORTINHO, 2001; BONISSON et al, 2007; GREENBERG et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). O PC acomete normalmente mulheres adultas com idade acima dos 50 anos. Alguns autores afirmam não haver predileção por raça, porém Davenport et al. (2001) citam os caucasianos como os mais afetados (LASKARIS et al, 2004; BONISSON et al, 2007; FREITAS et al, 2008; GREENBERG et al, 2008). As lesões podem envolver pele, mucosa conjuntiva, nasal, esofágica, laríngea, genital e bucal. As lesões em pele de região de cabeça e pescoço estão presentes em 20 a 30% dos
46
pacientes (LASKARIS et al, 2004; BONISSON et al, 2007; GREENBERG et al, 2008; REGEZI et al, 2008). As lesões bucais acometem de 90% a 100% dos pacientes com PC, sendo a gengivite descamativa a manifestação mais comum, podendo ser a única manifestação da condição. No entanto, as lesões podem apresentar caráter difuso, envolvendo mucosa alveolar, palato, mucosa jugal, língua e assoalho bucal e podem apresentar-se como vesículas intactas recorrentes ou como erosões não-específicas, bastante dolorosas e persistentes quando não tratadas. Quando comparadas com as lesões de PV, mostram difusão mais lenta e autolimitante (LASKARIS et al, 2004; BONISSON et al, 2007; FREITAS et al, 2008; GREENBERG et al, 2008; NEVILLE et al, 2009).
Figura 11 - Penfigóide cicatricial – erosões graves no palato Fonte: Laskaris et al. 2004
Figura 12 - Penfigóide cicatricial – ulcerações bucais extensas e irregulares Fonte: Neville et al. 2009.
47
O envolvimento ocular está presente em cerca de 61% a 80% dos pacientes e pode ser considerada a complicação mais significativa da doença, pois pode levar ao desenvolvimento do simbléfaro, que caracteriza-se por áreas de aderências e cicatrizes entre a conjuntiva palpebral e bulbar. O dano corneal é progressivo e causa cegueira em aproximadamente 15% dos pacientes com a doença. Pesquisas indicam que 25% dos pacientes com lesões bucais, quando não tratados previamente, podem desenvolver lesões oculares (BONISSON et al, 2007; FREITAS et al, 2008; GREENBERG et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). Ainda não existe um tratamento ideal para todos os pacientes portadores de PC sendo, portanto, necessário individualizar a terapêutica a cada condição. O manejo deve ser adotado de acordo com a severidade dos sintomas. Os fatores a serem considerados durante a escolha da melhor terapêutica são a distribuição das lesões, a atividade da doença e a resposta do paciente aos medicamentos escolhidos (GREENBERG et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). Para pacientes com manifestação branda a moderada da doença, deve-se optar pelo tratamento com esteróides tópicos e intralesionais, pois o PC, diferentemente do PV, não é uma doença fatal e o uso de corticosteróides sistêmicos a longo-prazo pode não ter o melhor custobenefício devido aos diversos efeitos colaterais dos mesmos (LASKARIS et al, 2004; GREENBERG et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). Quando encontradas lesões limitadas apenas à cavidade bucal, a doença pode ser controlada com aplicação de um ou mais corticóides tópicos sobre as lesões várias vezes ao dia. Após o controle das lesões bucais, deve-se suspender a aplicação. Em caso de recidiva, pode-se optar pela aplicação com alternância de dias para prevenir a exacerbação do quadro (REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). Para a terapêutica com agentes tópicos geralmente são utilizados o acetato de triancinolona a 0,1% ou 0,5% e propionato de clobetasol a 0,05%, com aplicações diárias de 2 a 3 vezes ao dia, durante 4 semanas. A ciclosporina tópica também pode ser efetiva na redução e desaparecimento dessas lesões (BONISSON et al, 2007). Quando utilizados em grandes áreas e por longos períodos de tempo, o clínico deve ficar atento e monitorar possíveis efeitos adversos como candidíase e a possibilidade de absorção sistêmica (GREENBERG et al, 2008). Pacientes com manifestação da doença apenas em mucosa gengival podem reduzir a severidade das lesões ao realizarem uma adequada e efetiva higiene bucal com uma escova de cerdas macias, com
48
consequente diminuição da quantidade de corticoide tópico utilizado (NEVILLE et al, 2009). Quando a terapia tópica ou intralesional não surtirem efeito, deve-se tentar terapia com corticoides sistêmicos e um agente imunossupressor (geralmente a ciclofosfamida), sendo essencial a participação de um médico no processo terapêutico (FREITAS et al, 2008; REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). Pacientes com lesões extensas ou em outras mucosas podem necessitar de uma terapêutica mais agressiva, com antiinflamatórios e/ou imunossupressores. Tem-se adotado uma terapia sistêmica alternativa aos corticoides sistêmicos para diminuir os efeitos colaterais. A dapsona tem sido utilizada em alguns centros onde há relatos de que esse fármaco modula condições vesiculo-bolhosas, como o pênfigóide cicatricial. A posologia indicada pela literatura preconiza a prescrição de 25 mg/dia por 3 dias, 50 mg/dia por 3 dias, 75 mg/dia por 3 dias, 100 mg/dia por 3 dias e no 13º dia 150 mg/dia (BONISSON et al, 2007; REGEZI et al, 2008). Medidas de higiene associadas à terapia medicamentosa também podem beneficiar na melhora do quadro do paciente. A administração de corticoides controla, porém não cura definitivamente a doença, motivo pelo qual a atuação do cirurgião-dentista é de fundamental importância no controle da remissão e exacerbação das lesões bucais e da evolução sistêmica da doença (LINS et al, 2009). 2.4.2.4 LÍQUEN PLANO Líquen plano (LP) (Fig.13) é uma doença mucocutânea crônica comum, que frequentemente atinge a pele e a mucosa bucal. Evidências atuais indicam que a condição não consiste em uma doença autoimune clássica, porém envolve dano epitelial imunomediado por linfócitos T (SCULLY et al, 2008; REGEZI et al, 2008; CASTELS et al, 2010). O conhecimento das questões associadas ao líquen plano é de fundamental importância para cirurgiões-dentistas, pois o comprometimento bucal frequentemente antecede lesões cutâneas (MARTINS et al, 2008). O líquen plano cutâneo pode acometer aproximadamente 0,1% a 4% da população e manifesta-se classicamente como pápulas poligonais, púrpuras, pruriginosas, afetando regiões flexoras de extremidades. Alterações em linhas brancas finas (estrias de Wickham) também podem ser encontradas na glande do pênis, na mucosa vulvar e nas unhas (NEVILLE et al, 2009; CASTELS et al, 2010).
49
As lesões aparecem geralmente em adultos de meia idade, entre 30 e 60 anos, sendo mais frequentes na 5ª década de vida, com predominância do sexo feminino de 3:2, chegando a relatos de 4:1. Estudos epidemiológicos indicam que 0,1% a 2,2% da população podem ter líquen plano bucal (LASKARIS et al, 2004; GREENBERG et al, 2008; MARTINS et al, 2008; CANTO et al, 2010; CASTELS et al, 2010; HERNANDEZ et al, 2011). A etiologia ainda permanece desconhecida, mas associa-se o líquen plano com causa multifatorial como ansiedade, estresse, diabetes, outras condições autoimunes, doenças intestinais, drogas, hipertensão, infecções, neoplasias e predisposição genética. Evidências atuais têm relacionado o líquen plano com infecção pelo vírus da hepatite C, porém ainda é um dado controverso (CANTO et al, 2010; CASTELS et al, 2010; HERNÁNDEZ et al, 2011; HAKKOU et al, 2012). Atualmente relata-se 6 tipos de líquen plano bucal: tipo em placa, reticular, erosivo/ulcerativo, papular, atrófico e bolhoso. As mais relatadas, no entanto, são as formas reticular e erosiva (LASKARIS et al, 2004; NEVILLE et al, 2009; SCULLY et al, 2009;CASTELS et al, 2010). As lesões mais frequentes de líquen plano bucal são do tipo reticular. Normalmente são assintomáticas e envolvem a região posterior da mucosa jugal bilateralmente. Outras regiões como dorso e borda lateral de língua, gengiva, palato e vermelhão do lábio podem estar envolvidos simultaneamente. Classicamente essas lesões apresentam-se como pápulas brancas pequenas, simétricas que geralmente se coalescem e formam finas linhas (estrias de Wickham) ou uma rede de linhas que podem passar por melhora ou piora em semanas ou meses (GREENBERG et al, 2008; MARTINS et al, 2008; CANTO et al, 2010; CASTELS et al, 2010; HERNÁNDEZ et al, 2011). O líquen plano erosivo caracteriza-se pelo aparecimento de áreas ulceradas irregulares na região central da lesão que podem estar cobertas por uma placa de fibrina ou pseudomembrana. As lesões geralmente causam dor e desconforto, gerando incômodo. Localizam-se frequentemente em mucosa jugal, língua e gengivas e, mais raramente, em lábios, palato e assoalho bucal. (LASKARIS et al, 2004; REGEZI et al, 2008; SCULLY et al, 2008; NEVILLE et al, 2009; CANTO et al, 2010; CASTELS et al, 2010; HERNÁNDEZ et al, 2011; HAKKOU et al, 2012).
50
Figura 13 - Líquen plano erosivo - Úlcera em mucosa jugal Fonte: Laskaris et al. 2004.
A etiologia e patogênese do líquen plano erosivo ainda são desconhecidas, porém estudos têm mostrado que a doença relaciona-se a um antígeno epidérmico líquen-plano específico presente em algumas células epiteliais (COZZANI et al, 2008; SCULLY et al, 2009; CASTELS et al, 2010; HERNÁNDEZ et al, 2011). Esse antígeno epidérmico causa alterações na camada basal e nos estratos adjacentes do epitélio. Acima da lâmina própria pode-se observar o aparecimento de um infiltrado inflamatório mononuclear denso em faixa. Ocorre então, a degeneração hidrópica das células basais, resultando, finalmente, na separação do epitélio da membrana basal. Essa separação resulta em vesículas ou bolhas e, posteriormente, erosão e/ou ulceração (GREENBERG et al, 2008; SCULLY et al, 2008; NEVILLE et al, 2009; HERNÁNDEZ et al, 2011). As formas atrófica e erosiva podem estar confinadas à mucosa gengival, gerando um quadro denominado gengivite descamativa. Cerca de 10% dos pacientes com LPO apresentam lesões confinadas exclusivamente à gengiva (LASKARIS et al, 2004; REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009; CANTO et al, 2010). A principal dificuldade no manejo de pacientes com líquen plano erosivo (LPE) é a natureza crônica da condição, pois revela períodos bastante oscilantes entre exacerbação e remissão. O tratamento de escolha na maioria das vezes é empírico, não apresentando padronização totalmente satisfatória e definitiva. Depende da gravidade da doença: leve, moderada ou severa (LASKARIS et al, 2004; MARTINS et al, 2008; SCULLY et al, 2009; HERNÁNDEZ et al, 2011).
51
O tratamento do líquen plano erosivo leve - nos casos em que há envolvimento bucal reduzido, com pouca sintomatologia - consiste, rotineiramente, do uso de corticoides tópicos. Geralmente não se faz necessário o uso de corticoides sistêmicos, pois os tópicos potentes – fluocinonida, betametasona, clobetasol gel e fluticasona - são capazes de controlar as lesões bucais. A aplicação desses agentes de 3 a 5 vezes por dia nas áreas sintomáticas, geralmente induz a cicatrização dentro de uma a duas semanas. Esses fármacos são, posteriormente, substituídos por corticoides de baixa potência – hidrocortisona, hemissuccinato, acetato de triancinolona e flucinolona (LASKARIS et al, 2004; MARTINS et al, 2008; REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009; SCULLY et al, 2009; HERNÁNDEZ et al, 2011). O tratamento do líquen plano erosivo moderado, nos casos em que há envolvimento bucal extenso ou severo, consiste do uso inicial de ciclosporina ou tacrolimus tópico, em associação a corticoides tópicos de alta ou superpotência (40 a 80mg de prednisona diários). Geralmente é o tratamento de escolha quando o LPE está associado à gengivite descamativa (NEVILLE et al, 2009; SCULLY et al, 2009; HERNÁNDEZ et al, 2011). Para aplicação das pomadas e géis, podem ser utilizadas moldeiras adaptadas ou protetores bucais durante a noite (SCULLY et al, 2009). O tratamento do líquen plano erosivo severo, nos casos em que há a presença de muitos sítios, consiste no uso de corticoides sistêmicos – azatioprina, ciclofosfamida, hidroxicloroquina acitretina, talidomida ou ciclosporina. Em alguns casos a dapsona também pode ser eficaz (MARTINS et al, 2008; REGEZI et al, 2008; SCULLY et al, 2009; HERNÁNDEZ et al, 2011). Sugere-se que pacientes com LPE devem ser avaliados com maior frequência, a cada três meses (MARTINS et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). De modo geral, para o tratamento das formas de LP, a adoção de uma terapia antifúngica concomitante resulta em melhora do quadro, pois pode eliminar infecções secundárias por Candida albicans no local das lesões (HERNÁNDEZ et al, 2011).
52
2.4.3
ÚLCERAS RELACIONADAS A DOENÇAS HEMATOLÓGICAS
Para Greenberg et al. (2008) e Scully (2008), as doenças hematológicas que causam manifestação bucal com maior freqüência são as anemias, leucemias e neutropenias. 2.4.3.1 ANEMIAS A anemia está presente sempre que houver uma diminuição da quantidade normal de hemoglobina circulante. Muitos podem ser os fatores que resultarão nessa redução: hemorragia, destruição de hemácias, diminuição na produção de hemácias ou uma combinação de todos esses fatores. Mesmo que haja combinação de fatores, no entanto, há o predomínio de um dos mecanismos (GREENBERG et al, 2008). As anemias são classificadas de acordo com sua etiopatologia: Quando relacionadas ao tamanho das hemácias: microcítica, normocítica ou macrocítica; Quando relacionadas à concentração de hemoglobina: hipocrômica, normocrômica ou hipercrômica (GREENBERG et al, 2008). Todas as anemias causam sintomas como palidez de pele, conjuntiva palpebral e leitos ungueais, dispnéia e cansaço fácil (GREENBERG et al, 2008). As anemias com manifestações orais mais comuns serão abordadas no presente trabalho: 2.4.3.1.1
ANEMIA POR DEFICIÊNCIA DE FERRO
A anemia por deficiência de ferro é a anemia mais comum, afetando cerca de 30% da população mundial. De acordo com dados liberados do 4º Relatório da Situação Nutricional Mundial (1998) em países em desenvolvimento, os grupos mais afetados por essa condição são mulheres grávidas, chegando a quase 60% de prevalência e idosos, com prevalência aproximada de 50%. Ocorre em 5% a 12% de mulheres sadias em período pré-menopausa, geralmente relacionada à perda de sangue menstrual, demandas de gravidez, amamentação ou dieta com deficiência de ferro (PROVAN, 2003; GODDARD et al, 2005; JHB, 2006; GREENBERG et al, 2008).
53
Para GODDARD et al (2005), as causas mais comuns de anemia são menstruação (20% a 30% dos casos), uso de aspirina (10% a 15%), carcinoma de cólon, (5% a 10%), ulceração gástrica benigna (5% dos casos), angiodisplasia (5% dos casos), colonização por H. pyllori (5% dos casos) e doença celíaca (4% a 6% dos casos) (GODDARD et al, 2005). A condição é caracterizada por um defeito na síntese de hemoglobina, resultando em anormalidade nas células vermelhas (hemácias), tornando-as microcíticas e hipocrômicas. A partir dessa condição, o sangue perde capacidade de fornecer oxigênio para tecidos e células (PROVAN, 2003; ALTON, 2005; GODDARD et al, 2005). Além dos sintomas citados anteriormente, pacientes com anemia por deficiência de ferro relatam ter tendência de partir ou quebrar unhas facilmente, fadiga, letargia, tontura, cefaléia, dificuldade em respirar, zumbido nos ouvidos, distúrbios do paladar, síndrome das pernas irrequietas, esclera azulada, glossite e queilite angular (ALTON, 2005; GREENBERG et al, 2008). O principal sinal bucal da anemia por deficiência de ferro é a palidez da mucosa. Porém, com o agravar do quadro, pode-se observar perda da queratinização normal da mucosa em função da atrofia das células do epitélio bucal (GREENBERG et al, 2008). Um estudo realizado por Pinski et al (2002) apud Guimarães et al (2005), concluiu que UAR podem estar relacionadas a deficiência de ferro entre outros fatores nutricionais (BARRONS et al, 2001; GUIMARÃES et al, 2005). As UAR foram descritas anteriormente no tópico 2.4.1 ÚLCERAS IDIOPÁTICAS – 2.4.1.1 ÚLCERAS AFTOSAS RECORRENTES. O tratamento para anemia por deficiência de ferro tem como objetivo restaurar os níveis de hemoglobina e hemácias ao normal, além de reconstituir o armazenamento de ferro. Deve consistir, primeiramente, em evitar perdas de ferro adicionais e repor a sua suplementação. O melhor meio de reposição de ferro é via bucal. Recomenda-se a administração bucal de sulfato de ferro 200mg duas vezes ao dia, por 6 meses a 1 ano. Pacientes que não toleram bem essa dose, podem ter a quantidade diminuída, sem alteração da efetividade. A administração concomitante de ácido ascórbico de 250 a 500mg duas vezes ao dia pode melhorar a absorção de ferro. Orientação nutricional e identificação da causa são de fundamental importância para resolução integral do quadro. A suplementação deve ser continuada por mais 3 meses, a partir do período de constatação que os níveis sorológicos de
54
ferro foram restaurados (GODDARD et al, 2005; OLIVEIRA et al, 2009; CANÇADO et al, 2010). Deve-se ficar atento em casos de anemias persistentes, pois outras causas, que não apenas de deficiência na absorção podem estar presentes, como doença celíaca (DC), a ser discutida posteriormente no trabalho. 2.4.3.1.2
ANEMIA APLÁSICA
Anemia aplásica é um raro distúrbio hematológico que ameaça a vida, originado por uma insuficiência medular que leva a pancitopenia – uma diminuição de todos os tipos celulares no sangue periférico, dentre eles: neutrófilos (neutropenia) e plaquetas (trombocitopenia) (LASKARIS et al, 2004; GREENBERG et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). A neutropenia é caracterizada pela diminuição da contagem absoluta de neutrófilos de mais de dois desvios padrões do valor médio. O valor normal absoluto de neutrófilos no sangue periférico é de 3000/mm³ a 6000/mm³. Uma neutropenia discreta ocorre quando esses valores encontram-se entre 1000/mm³ a 2000/mm³, neutropenia moderada quando esses valores estão na faixa de 500/mm³ a 1000/mm³ e neutropenia severa há presença de menos de 500/mm³ no sangue periférico (LASKARIS et al, 2004; GREENBERG et al, 2008; MS, 2010). A trombocitopenia ocorre quando a quantidade de plaquetas está diminuída e é causada por: (1) produção diminuída da medula óssea, (2) sequestro aumentado pelo baço e (3) destruição acelerada (GREENBERG et al, 2008). Esse tipo de anemia pode ocorrer por indução de medicamentos como cloranfenicol, sulfonamidas ou fenilbutazona ou outros agentes externos como benzeno, pode ser causada por vírus como da hepatite C, Epstein-Barr ou HIV, irradiação ou pode ter origem idiopática; (OLIVEIRA et al, 2009; MS, 2010). Sinais e sintomas como palidez mucocutânea, fadiga, fraqueza estão frequentemente presentes em pacientes com anemia aplásica. Outros, como infecções, linfoadenopatia e esplenomegalia também podem estar presentes, porém são mais raras (OLIVEIRA et al, 2009). A ocorrência de úlceras bucais decorrentes da anemia aplásica é relacionada com o grau de neutropenia e trombocitopenia (GREENBERG et al, 2008).
55
Nessa desordem, as manifestações bucais geralmente são iniciadas pelo aparecimento de petéquias evoluindo, em quadros mais graves, para a presença de sangramentos gengivais espontâneos e ulcerações necróticas em palato e gengiva (LASKARIS et al, 2004). O tratamento em casos menos graves consiste do uso de androgênio e corticóides com baixa taxa de toxicidade com uma alta taxa de resposta e um baixo risco de recidiva e complicações. O recomendado é a associação de três medicamentos: ATG (Imunoglobulina antilinfócitos – um imunossupressor), corticóide e ciclosporina. Em casos mais graves e na presença de um doador, o recomendado é a realização de transplante de medula óssea (PITA et al, 2001; OLIVEIRA et al, 2009). 2.4.4
ÚLCERAS RELACIONADAS A DOENÇAS GASTROINTESTINAIS
2.4.4.1 DOENÇA CELÍACA A doença celíaca (DC) é uma intolerância permanente ao glúten, causada por uma resposta autoimune mediada por linfócitos T que resulta em dano à mucosa intestinal nos indivíduos que tem susceptibilidade genética à doença. A atrofia parcial ou total das vilosidades causa má absorção de macro e micronutrientes, incluindo ferro, cálcio e vitaminas (BARRONS et al, 2001; OWEN; GREENSON et al, 2007; SILVA et al, 2008; MALAHIAS et al, 2009; BROECK et al, 2010; LOHI et al, 2010; RASHID et al, 2011). Atualmente é considerada uma condição crônica, multissistêmica – que pode afetar vários órgãos. Pode manifestar-se em qualquer idade, desde que o glúten esteja presente na dieta. Além disso, observou-se que a DC apresenta uma forte tendência hereditária, sendo que parentes em primeiro e segundo grau de pacientes portadores da condição apresentam o risco de 5 – 15% de também desenvolverem a desordem. Condições autoimunes, entre elas, o diabete melito tipo 1, são fatores fortemente relacionados à DC (RASHID et al, 2011). A condição é uma das doenças gastrointestinais mais comuns do mundo com prevalência de 0,5% a 1% de toda população mundial. Estudos realizados para investigar a doença no Brasil mostraram que a prevalência da doença é muito maior do que previamente considerada. O primeiro estudo sorológico realizado no Brasil relacionado à DC, em 2000, com doadores de sangue do Distrito Federal, mostrou que a prevalência da condição era de 1 caso para cada 681 indivíduos
56
analisados. Um estudo mais recente, no entanto, realizado com doadores de sangue em Curitiba encontrou prevalência de 1 portador de DC para cada 347 indivíduos analisados (PEREIRA et al, 2006; MALAHIAS et al, 2009; LOHI et al, 2010; RASHID et al, 2011; SILVA et al, 2011). A DC pode manifestar-se em dois padrões: clássico e atípico (FARO et al, 2008; SILVA et al, 2011). A manifestação clássica ocorre pela formação de autoanticorpos, que causa uma inflamação persistente do intestino delgado. Os sintomas típicos são dor abdominal, vômitos, diarréia, perda de peso e anemias. Outros sinais e sintomas, menos comuns, podem estar presentes também como fraqueza excessiva, baixa estatura, osteoporose, ciclo menstrual irregular e infertilidade. No padrão atípico não ocorrem manifestações gastrointestinais evidentes, fato esse que dificulta o diagnóstico (FARO et al, 2008; MALAHIAS et al, 2009; LOHI et al, 2010; RASHID et al, 2011; SILVA et al, 2011). A doença pode envolver, além de outros órgãos, a cavidade bucal. Em alguns casos, a única manifestação pode ser percebida através de sinais e sintomas bucais como hipoplasia do esmalte, úlceras bucais, dor e queimação na língua, características de fundamental importância no diagnóstico dessa doença (MALAHIAS et al, 2009; LOHI et al, 2010; RASHID et al, 2011; SILVA et al, 2008; SILVA et al, 2011). Uma manifestação bucal clássica da DC inclui a presença de úlceras aftosas recorrentes (UAR), que ocorrem devido a deficiências nutricionais envolvendo macro e micronutrientes como ferro, ácido fólico, zinco e vitaminas B1, B2, B6 e B12. DC é duas vezes mais comum em pacientes com UAR do que em pacientes saudáveis, ocorrendo em 20% dos casos. Em dois estudos realizados por Campisi et al (2007) e Cheng et al (2010) apud Silva et al (2011), observou-se que 42% de pacientes com DC apresentavam úlceras aftosas recorrentes. Em um estudo realizado por Shakeri et al (2009), constatouse que 2,83% dos casos de UAR estavam relacionados com DC nãodiagnosticada (SHAKERI et al, 2009; SILVA et al, 2011). UAR também estão associadas a outros problemas gastrointestinais, como doença de Crohn e colite ulcerativa. No entanto, não existe evidência científica clara na literatura que confirme se o aparecimento das UAR está relacionado à deficiência nutricional ou aos mecanismos imunológicos decorrentes da doença (BARRONS et al, 2001; LASKARIS et al, 2004; REGEZI et al., 2008; SILVA et al, 2011; ERTEKIN et al, 2012). Em um estudo realizado por Ertekin et al, 2012, com pacientes portadores de DC, foi constatado que em 48,1% dos indivíduos
57
afetados, apenas UAR menores estavam presentes (ERTEKIN et al, 2012). As características das úlceras bucais decorrentes da DC foram abordadas no tópico 2.4.1 – Úlceras bucais de origem idiopática – 2.4.1.1 – Úlcera aftosa recorrente. O tratamento da DC é basicamente dietético, baseado na exclusão do glúten da dieta por toda a vida, em pacientes sintomáticos ou assintomáticos. Quando a doença não é tratada, há a possibilidade de complicações como esterilidade, osteoporose, endocrinopatias, distúrbios neurológicos e psiquiátricos, doenças do sistema hepático e conjuntivo e doenças autoimunes associadas – dermatite herpetiforme, diabete melito, deficiência seletiva IgA e doença da tireóide (SILVA et al, 2008; LOHI et al, 2010; SILVA et al, 2011). Estudos relatam que o uso da dapsona no início da dieta livre de glúten pode melhorar o quadro inicial de lesões cutâneas e bucais, pois os sintomas tendem a permanecer por dias a semanas após a suspensão de seu uso (LOHI et al, 2010). 2.4.5
ÚLCERAS BUCAIS RELACIONADAS A DOENÇAS INFECTOCONTAGIOSAS
2.4.5.1 DOENÇAS VIRAIS 2.4.5.1.1
HERPES SIMPLES
O herpes simples (HSV) (Fig.15) é uma doença viral infectocontagiosa que se manifesta como erupções vesiculares na mucosa e/ou na pele e é a causa viral mais comum do aparecimento de ulcerações. É uma doença potencialmente recorrente e autolimitada, sendo caracterizada pela latência e reativação do vírus durante períodos de imunossupressão REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; LEÃO et al, 2007; MAROTTI et al, 2008; REGEZI et al, 2008; SCULLY et al, 2008). A inoculação do vírus herpes simples acontece através de contato físico com um indivíduo infectado, sendo veiculado por meio de saliva ou outros fluidos corporais, após um período de incubação de aproximadamente 4 a 7 dias. A maioria dos indivíduos portadores do HSV-1 não apresentam manifestações clínicas da doença (MAROTTI et al, 2008; REGEZI et al, 2008; SCULLY et al, 2008). Após o contato com o vírus, as glicoproteínas presentes na superfície do HSV ligam-se à superfície celular do hospedeiro, regulam
58
a fixação e penetração celular do vírus e realizam ativações sequenciais de genes específicos durante a fase lítica da infecção. A infecção primária – Gengivoestomatite herpética aguda (GEHA) (Fig.14) ocorre apenas quando um indivíduo suscetível não-imune desenvolve a infecção. Apenas uma pequena parcela da população apresenta os sinais clínicos sistêmicos da doença, sendo muito mais freqüentes manifestações na forma subclínica. A incubação do vírus acontece dentro de um período de tempo de alguns dias até duas semanas. O vírus, então, infecta neurônios da raiz dorsal e dos gânglios autônomos – geralmente o trigeminal, permanecendo latente até ser reativado. A reativação pode ser desencadeada pelo estresse emocional, exposição à luz solar, menstruação, febre, trauma mecânico, gravidez, exposição ao frio e/ou condições de imunossupressão (LASKARIS et al, 2004; LEÃO et al, 2007; MAROTTI et al, 2008; REGEZI et al, 2008; SCULLY et al, 2008). Na forma primária (GEHA), as lesões apresentam-se caracteristicamente como áreas focais de erupções vesiculares espalhadas pela cavidade bucal que terminam por romper-se e originar úlceras associadas a sinais e sintomas sistêmicos de linfoadenopatia cervical anterior, calafrios, febre (39,4ºC a 40,5ºC), náusea, inapetência e irritabilidade. As manifestações variam de uma debilidade leve a intensa. Na forma secundária os sinais sistêmicos são ausentes e as vesículas acontecem em áreas localizadas, principalmente perilabial (herpes labial). O herpes labial é a reativação do HSV-1, que fica retido no tecido ganglionar em um estado latente, sendo a manifestação mais comum desse vírus (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; LASKARIS et al, 2004; REGEZI et al, 2008; SCULLY et al, 2009).
Figura 14 - GEHA - Múltiplas ulcerações em dorso de língua Fonte: Laskaris et al. 2004.
59
Aproximadamente 5% da população que tem a infecção primária por HSV-1 apresentam episódios recorrentes de herpes labial. Esse quadro pode incluir episódios de parestesia, eritema, vesículas, pústulas e ulcerações na junção mucocutânea dos lábios e/ou nariz (LEÃO et al, 2007). As lesões são precedidas por sinais prodrômicos até 24 horas antes do seu aparecimento e se caracterizam por prurido, queimação, dor moderada e ardência, seguidos de múltiplas vesículas, que se rompem tornando-se ulcerações pequenas e superficiais. O tamanho pode variar entre 1 a 3 mm de diâmetro para cada vesícula e, quando coalescidas, de 1 a 2 cm. A infecção secundária geralmente acomete lábios e pele circunjacente e, intrabucalmente, palato duro e gengivas (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; LASKARIS et al, 2004; LEÃO et al, 2007; GREENBERG et al, 2008; MAROTTI et al, 2008; CONSOLARO et al, 2009).
Figura 15 - Herpes simples - Ulceração em região perilabial Fonte: Laskaris et al. 2004.
Pacientes imunocomprometidos devido à AIDS, transplante ou quimioterapia contra o câncer tendem a desenvolver lesões amplas crônicas, que podem acometer qualquer sítio da mucosa bucal. Recorrências severas da infecção podem ser sugestivas de presença de imunodeficiência, em particular, doenças linfoproliferativas, como linfomas Hodgkin, não-Hodgkin e leucemias e HIV (LEÃO et al, 2007; GREENBERG et al, 2008). O herpes simples normalmente apresenta remissão espontânea – devido a sua característica autolimitante, com remissão completa entre 10 a 14 dias. O tratamento medicamentoso pode ser indicado para diminuir a sintomatologia dolorosa e a febre, sendo indicados analgésicos e antipiréticos como paracetamol ou solução de ibuprofeno.
60
Dieta com alimentos leves e macios e a utilização de antissépticos locais, como gluconato de clorexidine a 0,2%, são orientações de suporte que auxiliam na redução da sintomatologia. No estágio inicial – compreendido até 48 horas após o aparecimento dos sinais e sintomas, medidas terapêuticas sistêmicas podem ser adotadas com o objetivo de interromper a replicação do vírus com o uso de aciclovir, valaciclovir ou fanciclovir (MAROTTI et al, 2008; REGEZI et al, 2008; SCULLY et al, 2008; CONSOLARO et al, 2009). O aciclovir tem apresentado mais eficácia no controle do herpes genital e, em menor grau, no herpes labial primário (GEHA). Pode-se administrar o fármaco 5 vezes ao dia, em comprimidos de 200mg ou 400mg. A administração de antivirais na forma secundária (herpes recorrente) diminui a progressão e severidade das lesões, não altera, no entanto, episódios de recidiva. Aciclovir tópico 5%, 5 vezes ao dia também pode ser utilizado logo que os primeiros sintomas aparecerem. Seu uso reduz a duração das lesões, podendo até impedir seu aparecimento (REGEZI et al, 2008; SCULLY et al, 2008). O valaciclovir é uma evolução do aciclovir e tem sua biodisponibilidade de 2 a 5 vezes maior do que aciclovir. A terapêutica consiste no uso de 1 comprimido de 500mg a cada 12 horas, durante 5 dias quando houver surto da lesão. Essa conduta reduz consideravelmente o desconforto e o tempo de duração das lesões para cerca de 2 dias, podendo inibir totalmente a manifestação do quadro quando administrado precocemente. Alguns autores sugerem que com o uso do valaciclovir episódios de recorrência sejam menos frequentes, fato esse que não acontece com o uso do aciclovir (CONSOLARO et al, 2009). Há evidências de que com a perfuração das vesículas com instrumento perfurante esterilizado, associada ao uso de medicamentos tópicos, possa reduzir em aproximadamente 70% o tempo das lesões e suas manifestações sintomáticas. Essa manobra, no entanto, deve ser realizada com muita cautela, pois pode ocasionar autoinoculação do vírus em tecidos vizinhos pelo contato com o líquido contaminado (CONSOLARO et al, 2009). Estudos recentes mostram que a terapia a laser de baixa potência pode atuar como coadjuvante no tratamento do herpes labial, podendo diminuir a frequência dos casos de recorrência (MAROTTI et al, 2008).
61
2.4.5.1.2 2.4.5.1.2.1
CATAPORA/VARICELA VARICELA
Catapora é a infecção primária do vírus varicela-zoster (VZV). É uma condição extremamente contagiosa, exantematosa e ocorre principalmente em crianças entre 5 e 9 anos de idade (LASKARIS et al, 2004; REGEZI et al, 2008; SCULLY et al, 2008; NEVILLE et al, 2009; YOUNG NA et al, 2009). A transmissão acontece, principalmente pela inalação de perdigotos e, menos frequentemente, pelo contato direto com as lesões. O vírus tem um período de incubação que varia de 14 a 21 dias e, após esse período, ocorre a replicação do vírus dentro dos macrófagos, com posterior viremia e disseminação tanto cutânea como para outros órgãos. A doença é mais prevalente em estações como inverno e primavera e exibe lesões em diferentes estágios (REGEZI et al,2008; SCULLY et al, 2008; REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; NEVILLE et al, 2009; FBP, 2011; SANTOS et al, 2011). O vírus VZV multiplica-se nos gânglios regionais e 4 a 6 dias após a contaminação ocorre a viremia subclínica, período em que há a disseminação sistêmica. A replicação ocorre, então, no sistema reticuloendotelial até que haja a segunda viremia aproximadamente 15 dias após a infecção (SANTOS et al, 2011). Cerca de 50% dos casos apresentam infecção subclínica. Quando as características clínicas estão presentes, essas incluem: erupções maculopapulares cutâneas exuberantes em face, pruriginosas, que evoluem para vesículas, pústulas e, por fim, úlceras que variam de 2 a 3 mm de diâmetro. Localizam-se geralmente no couro cabeludo, pescoço e tronco. As manifestações bucais da varicela, mesmo que infreqüentes, são mais comumente encontradas em palato e lábios e podem aparecer em outras membranas mucosas. Somado a isso, o paciente apresenta febre baixa, calafrios, mal-estar, inapetência, irritabilidade, linfadenite cervical, cefaleia e úlceras bucais (LASKARIS et al, 2004; REGEZI et al, 2008; SCULLY et al, 2008; YOUNG NA et al, 2009; FBP, 2011). O período de erupção ocorre entre 4 a 7 dias, em variados estágios da doença. Indivíduos, mesmo na forma prodrômica, são infectantes desde 2 dias antes do aparecimentos das lesões até que todas estejam na forma de crosta (NEVILLE et al, 2009).
62
2.4.5.1.2
HERPES ZOSTER (VARICELA ZOSTER)
A evolução normal da doença é a migração através dos nervos sensitivos para o gânglio sensitivo e a sua permanência latente de forma indetectável. A reativação do vírus é incomum e, em episódios de imunossupressão, resulta na forma secundária denominada herpes zoster ou varicela zoster (Fig.16), uma doença aguda e localizada (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; LASKARIS et al, 2004; SCULLY et al, 2008; REGEZI et al, 2008). Herpes zoster geralmente atinge pacientes idosos com idade superior a 50 anos e imunocomprometidos, como portadores de HIV, leucemia ou câncer, em uso de corticóide ou outras drogas imunossupressoras e durante a radioterapia (LASKARIS et al, 2004; SCULLY et al, 2008). Sinais prodrômicos precedem por vários dias o aparecimento de lesões cutâneas e bucais, como parestesia e dor (presente antes, durante e após as erupções). Dois a quatro dias após a reinfecção do nervo sensorial, (principalmente da cabeça, pescoço ou tronco) erupções cutâneas vesiculares em distribuição ipsilateral semelhante a uma faixa, manifestam-se e, posteriormente, tornam-se pustulares e ulceradas. A condição permanece por várias semanas e, em 15% dos casos, é seguida de nevralgia pós-herpética renitente (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; LASKARIS et al, 2004; SCULLY et al, 2008; REGEZI et al, 2008). O envolvimento de vários ramos do nervo trigêmeo pode resultar em lesões bucais, faciais e oculares unilaterais. A maioria das lesões por varicela zoster é observada em região torácica e somente 30% em região trigeminal. Apresenta manifestação bucal quando o segundo ou terceiro ramo do nervo trigêmeo estiverem envolvidos e geralmente aparece acompanhada de lesões unilaterais em face (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; LASKARIS et al, 2004; SCULLY et al, 2008; REGEZI et al, 2008). As lesões bucais são semelhantes às cutâneas e aparecem inicialmente como vesículas que logo se rompem, transformando-se em lesões erosivas de superfície esbranquiçada com um halo eritematoso circunjacente. As úlceras bucais relacionadas ao herpes zoster são observadas somente no zoster maxilar – ipsilateral em palato e vestíbulo ou zoster mandibular – ipsilateral em mucosas jugal e lingual (LASKARIS et al, 2004; SCULLY et al, 2008).
63
Figura 16 – Varicela Zoster - Numerosas vesículas brancoopacas em mucosa jugal Fonte: Neville et al. 2004.
A maioria dos casos é autolimitante; por esse motivo, o tratamento é sintomático e geralmente realizado com analgésicos e sedativos. O tratamento inicial com baixas doses de prednisolona 15mg ou 20mg/dia diminui a possibilidade de neuralgia pós-herpética. Em casos graves pode-se administrar aciclovir, valaciclovir e formciclovir, com objetivo de diminuir a dor e também prevenir a neuralgia pósherpética (LASKARIS et al, 2004; SCULLY et al, 2008; FBP, 2011). Em 1974 foi desenvolvida uma vacina de vírus vivo atenuado contra o VZV. Crianças vacinadas atingem soroconversão de 88% com uma dose da vacina e 94% com duas doses. A persistência dos anticorpos por até 10 anos é de 90%, porém decai a 75% em adultos (CARVALHO et al, 1999). 2.4.5.1.3
HERPANGINA
Os coxsackie vírus são enterovírus de RNA que se multiplicam no intestino após serem ingeridos com água ou alimento contaminados. São separados em dois grupos, A e B. Existem 24 tipos conhecidos de coxsackie vírus tipo A e 6 do tipo B. Esses vírus causam hepatite, meningite, miocardite, pericardite e doença respiratória aguda. São transmitidos por saliva ou, ocasionalmente, fezes contaminadas. Em climas frios ocorrem com maior frequência no verão ou no outono; em países tropicais, no entanto, podem acontecer em qualquer estação do ano (AZANERO et al, 2006; GREENBERG et al, 2008; REGEZI et al, 2008; RUAN et al, 2011).
64
Os primeiros sintomas começam a aparecer 2 a 10 dias após a exposição ao vírus, com sintomas semelhantes a uma gripe, associados a sintomas intestinais. A doença causa febre, que varia entre 38˚ e 40˚C, dor de garganta, dor de cabeça, disfagia e mal-estar. Entre 24 a 48 horas após o aparecimento desses sintomas, surge um eritema difuso e erupção vesicular na região posterior da mucosa bucal e em orofaringe. A doença tem intensidade de leve a moderada, é autolimitada e após o contágio, fornece imunidade persistente para o vírus. O grupo A causa três manifestações clínicas na região bucal: a herpangina, a doença das mãos, pés e boca e faringite linfonodular aguda. (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; LASKARIS et al, 2004; AZANERO et al, 2006; GREENBERG et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). As lesões bucais da herpangina (Fig.17) geralmente precedem as lesões cutâneas e caracterizam-se por inúmeras e pequenas vesículas na parte posterior da mucosa bucal, principalmente no palato mole e/ou pilares amigdalianos, que se rompem rapidamente, deixando úlceras rasas e doloridas. Elas acometem palato mole, úvula, amígdalas, pilares anteriores, parede posterior da faringe e, menos freqüentemente, mucosa jugal e língua, desaparecendo após 7 a 10 dias. A ausência de lesões nos lábios, gengiva e assoalho bucal é uma importante característica, pois pode auxiliar no diagnóstico (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; LASKARIS et al, 2004; AZANERO et al, 2006; NEVILLE et al, 2009).
Figura 17 - Herpangina - Múltiplas ulcerações rasas em palato Fonte: Laskaris et al. 2004.
O tratamento das lesões bucais decorrentes da herpangina é sintomático, pois a condição é autolimitada, com remissão das lesões em 7 a 10 dias (LASKARIS et al, 2004; REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009).
65
2.4.5.1.4
HIV
A síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS) é uma doença infecciosa causada pelo retroHIV, que tem como células-alvo linfócitos e monócitos, causando severa imunossupressão. Existem dois tipos diferentes do vírus, HIV-1 e HIV-2, sendo ambos responsáveis por deterioração e AIDS; o tipo HIV-2, no entanto, é menos severo e transmissível que o primeiro (STEVENSON et al, 2003; GREENBERG et al, 2008; LOURENÇO et al, 2008; NEVILLE et al, 2009; BODHADE et al, 2011). A transmissão do vírus acontece, geralmente, por contato sexual sem proteção com uma pessoa infectada. No entanto, também pode ser transmitido por compartilhamento de agulhas e/ou seringas, da mãe infectada para o bebê no período perinatal ou durante a amamentação (contaminação vertical) e transfusão sanguínea, menos comum na atualidade (GREENBERG et al, 2008; LOURENÇO et al, 2008; SCULLY et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). Atualmente há relatos de que a transmissão do vírus também possa acontecer através de fluidos orais durante o ato de cunilíngua ou beijos violentos repetidos. A presença de lesões intrabucais como UAR, erosões, ulcerações e patologias inflamatórias hemorrágicas podem ser porta de entrada para o vírus, pois os fatores salivares inibitórios antiHIV não protegem totalmente contra sua transmissão (NEVILLE et al, 2009). O vírus tem como célula-alvo principal o linfócito T CD4+ helper. O DNA do vírus é incorporado ao DNA do linfócito, inviabilizando a célula de realizar sua função imunológica. A rápida replicação viral resulta na disseminação do vírus para os tecidos linfáticos para o resto do organismo. Estima-se que 10 bilhões de vírus sejam produzidos diariamente. Há uma relação inversa entre níveis séricos de viremia e contagem de linfócitos T CD4+ (ROWLANDJONES et al, 2003; STEVENSON et al, 2003; GREENBERG et al, 2008; NEVILLE et al, 2009; TAIWO et al, 2010; BODHADE et al, 2011). A queda progressiva nos níveis de T CD4+ reflete diretamente na progressão da doença e na expectativa de vida, mesmo na ausência de sintomas, pois níveis baixos dessas células predispõem o organismo do hospedeiro a uma série de infecções oportunistas, sendo mais suscetíveis a infecções fúngicas, virais, bacterianas e parasitárias. As manifestações clínicas variam enormemente, sendo que dentro do grupo de pessoas portadoras do vírus, algumas são sadias e apenas carregam
66
antígenos ou anticorpos do HIV. Outras, no entanto, estão na plenitude das manifestações da AIDS. Por esse motivo, os pacientes atualmente são classificados com base nos achados clínicos associados à infecção e contagem de linfócitos T CD4+ (Quadro 1) (ROWLAND-JONES et al, 2003; STEVENSON et al, 2003; LASKARIS et al, 2004; REGEZI et al, 2008; SCULLY et al, 2008; NEVILLE et al, 2009; TAIWO et al, 2010; BODHADE et al, 2011). Quadro 2- Classificação de pacientes HIV com base nos achados clínicos e contagem de células CD4+ Categorias
Células
A
B
C
Assintomático
Sintomático
Condições
ou infecção
(não A ou C)
definidoras de
aguda pelo HIV
AIDS
CD4+ 500/mm³
A1
B1
C1
200-499/mm³
A2
B2
C2
< 200/mm³
A3
B3
C3
Valores de referência de contagem de linfócitos T CD4+: 500 a 1500 células/mm³ (WHO, 2007). Fonte: Andrade (FIOCRUZ).
A síndrome pode apresentar-se, após a infecção, em fase assintomática ou aguda. A fase aguda geralmente desenvolve-se em 50% a 70% dos pacientes infectados, dentro de 1 a 6 semanas após a exposição, manifestando sintomas como faringite, febre, linfoadenopatia generalizada, erupção maculopapular, cefaléia, mialgia, artralgia, diarreia, fotofobia, neuropatias periféricas e úlceras orogenitais. Estudos mostraram que um nível estacionário de viremia no estado agudo, alcançado por meio de medicamentos antirretrovirais, é predicativo nos resultados de progressão clínica. Essa fase pode ser identificada pela presença de anticorpos-HIV ou pela identificação de produtos virais (ROWLAND-JONES et al, 2003; STEVENSON et al, 2003; WHO, 2007; NEVILLE et al, 2009). A fase aguda desaparece espontaneamente dentro de algumas semanas, entrando numa fase assintomática. Alguns indivíduos apresentam um quadro, durante a fase assintomática, denominado complexo relacionado à AIDS, em que apresentam linfoadenopatia
67
generalizada persistente, febre crônica, perda de peso, diarreia, candidíase bucal, herpes zoster e/ou leucoplasia pilosa. A manifestação da fase sintomática é variável, sendo diagnosticada, geralmente com a presença de infecções oportunistas (ROWLAND-JONES et al, 2003; STEVENSON et al, 2003; WHO, 2007; NEVILLE et al, 2009). Considera-se fase sintomática quando o indivíduo HIV-positivo portar um ou mais dos seguintes problemas (LASKARIS et al, 2004; REGEZI et al, 2008; SCULLY et al, 2008): Infecções oportunistas: a. Virais: herpes simples, herpes zoster, leucoplasia pilosa, citomegalovírus, verrugas; b. Bacterianas: tuberculose; c. Fúngicas: candidíase e histoplasmose; d. Protozoária e. Helmíntica; Neoplasias como sarcoma de Kaposi, linfoma não-Hodgkin; Condições autoimunes como úlceras aftosas e trombocitopenia, entre outras. As lesões bucais estão entre as manifestações clínicas iniciais da infecção por HIV. São marcadores preditivos da deterioração imunológica e progressão da doença, sendo mais evidentes em pacientes com níveis de células T CD4+ inferiores a 200 células/mm³. Em um estudo realizado por Lourenço et al (2008) observou-se que de 300 pacientes HIV-positivos avaliados, 113 (33,2%) apresentavam lesões bucais que incluíam queilite angular (13,9%), leucoplasia pilosa (15,8%), candidíase pseudomembranosa (37,8%) e úlceras (3,72%). A média de células T CD4+ entre esses indivíduos era de 236 células/mm³. Sendo que dentre os indivíduos com úlceras bucais, a média era de 300 células/mm³. Em um estudo realizado por Bodhade et al (2011), no entanto, observou-se que 76,7% dos pacientes apresentavam lesões bucais – quase o dobro do que descrito por Lourenço et al (2008) - porém níveis similares de células T CD4+ foram encontrados nessa pesquisa (LOURENÇO et al, 2008; TAIWO et al, 2010; BODHADE et al, 2011). No estudo realizado por Lourenço et al (2008) constatou-se também que lesões bucais são mais comuns em pacientes fumantes. Úlceras bucais, no entanto, foram observadas somente em pacientes não-fumantes (LOURENÇO et al, 2008).
68
Quadro 3- Estágio clínico de HIV/AIDS em adolescentes e adultos de acordo com sintomas clínicos ESTÁGIO
SINTOMAS CLÍNICOS Assintomático INFECÇÃO PRIMÁRIA Síndrome retroviral aguda Assintomático Linfoadenopatia generalizada ESTÁGIO CLÍNICO 1 persistente Perda de peso moderada inexplicada (< 10%) Infecções respiratórias recorrentes (sinusite, bronquite, otite média, faringite) Herpes zoster ESTÁGIO CLÍNICO 2 Queilite angular Úlceras orais recorrentes Erupções maculopapulares Dermatite seborreica Infecção fúngica nas unhas Perda de peso severa (> 10%) Diarreia crônica inexplicada por mais de 1 mês Febre persistente inexplicável (intermitente ou constante por mais de 1 mês) ESTÁGIO CLÍNICO 3* Candidíase bucal Leucoplasia pilosa bucal Tuberculose pulmonar (diagnosticada nos últimos 2 anos) infecções bacterianas severas (pneumonia, meningite, bacteremia) Tuberculose extrapulmonar infecção por herpes simples crônica (orolabial, genital, anorretal, com mais de 1 mês de duração) candidíase orofageana ESTÁGIO CLÍNICO 4* sarcoma de kaposi toxoplasmose no sistema nervoso central encefalite Fonte: WHO, 2005 (* Estágios 3 e 4 – Sinais clínicos ou simples investigação dão condições para diagnóstico).
69
Condições ulcerativas bucais foram significativamente associadas à doença em estágios avançados. Uma minoria dos pacientes com HIV severo podem desenvolver úlceras profundas e necrosantes de etiologia desconhecida. Essas úlceras são dolorosas, podem causar profunda disfagia e/ou disartria e podem aparecer em qualquer superfície mucosa, embora as mucosas bucal e faríngea sejam os sítios mais comumente afetados (LEÃO et al, 2007; TAIWO et al, 2010).
Figura 18 - Infecção pelo HIV - Lesões de herpes recorrente em palato Fonte: Laskaris et al. 2004.
Algumas condições sistêmicas que causam úlceras bucais são fortemente associadas ao HIV. São elas: A) doenças bacterianas: sífilis e tuberculose; B) virais: herpes simples, citomegalovirus, Epstein-barr vírus, varicela zoster vírus, papiloma vírus e C) ulcerações nãoespecíficas: estomatite necrosante, úlceras aftosas e úlceras induzidas por medicamentos antirretrovirais (GREENBERG et al, 2008). 2.4.5.1.4.1
CONDIÇÕES SISTÊMICAS FORTEMENTE ASSOCIADAS AO HIV
2.4.5.1.4.1.1 2.4.5.1.4.1.1.1
DOENÇAS BACTERIANAS SÍFILIS
Sífilis é uma doença infectocontagiosa, crônica de transmissão por via sexual (DST) causada pelo espiroqueta Treponema pallidum, que acomete quase todos os órgãos e sistemas. Em 2003 estimou-se 843.300 casos de sífilis no Brasil (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; OMS, 2005; LEÃO et al, 2007; BOTTINO et al, 2006).
70
O contato sexual com parceiros portadores de lesões ativas, o cancro duro ou lesões secundárias (placas mucosas), é responsável por 60% a 95% dos casos de sífilis. Embora todos os seres humanos sejam suscetíveis ao Treponema pallidum, apenas 30% dos indivíduos que entram em contato com o microorganismo desenvolvem a doença. Por meio dessas lesões mucocutâneas, o espiroqueta penetra o organismo por pequenas abrasões até atingir o sistema linfático regional do hospedeiro e outras partes do organismo por via hematogênica. O local de inoculação apresenta aspecto de erosão e exulceração como resposta de defesa. A transmissão pode também ocorrer por meio de transfusão de sangue contaminado, por via placentária e contato com exsudato de lesões recentes em pele e mucosas (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; LEÃO et al, 2007; SANTANA et al, 2005; SARACENI et al, 2005; BOTTINO et al, 2006). O agente, quando em contato com o hospedeiro, leva à produção gradual de imunidade. Pacientes que desenvolvem a sífilis aguda (primária ou secundária) não geram resposta imunológica e, por essa razão, são suscetíveis à novas infecções (SARACENI et al, 2005). A doença mostra três períodos de atividade com características que diferem clínica, imunológica e histopatologicamente, passando pelas fases primária, secundária, terciária e pelos períodos de latência, podendo manifestar ulcerações bucais em qualquer um dos seus três estágios (BOTTINO et al, 2006; REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). A lesão mucocutânea típica da fase primária é o cancro duro, que aparece no local da inoculação cerca de 3 semanas a 90 dias após o contato com o agente infeccioso; em média 21 dias. A lesão apresenta aspecto de pápula que varia de coloração rósea a um vermelho intenso e exulceração, indolor, geralmente única, com borda endurecida, fundo limpo/liso e brilhante, sem manifestação inflamatória perilesional (SARACENI et al, 2005; OMS, 2005; BOTTINO et al, 2006; MS, 2006). A manifestação bucal da sífilis no estágio primário (Fig.19), cancro duro, é semelhante às lesões genitais e torna-se clinicamente evidente de 3 a 90 dias após a exposição à bactéria. Manifesta-se geralmente como uma única lesão ulcerada central de base clara, indolor, endurecida à palpação, com borda em rolete no local da inoculação. Posterior desenvolvimento de linfoadenopatia regional bilateral, que se apresenta clinicamente como uma tumefação firme e indolor, também pode ser encontrada. A lesão bucal geralmente aparece nos lábios superiores (em mulheres) e nos lábios inferiores (em homens)
71
e manifesta-se como uma úlcera crônica indolor, que cicatriza espontaneamente após 3 a 8 semanas, sem tratamento. Ocasionalmente pode haver úlceras na gengiva, palato, língua e amígdalas (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; LEÃO et al, 2007; REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009).
Figura 19 - Sífilis primária - Dois cancros em dorso de língua Fonte: Laskaris et al. 2004.
O período compreendido entre o desaparecimento das úlceras da sífilis primária até o aparecimento das manifestações da sífilis secundária é chamado de período de latência, em que ocorre a disseminação sistêmica do treponema pallidum, resultando na dispersão da bactéria para pele e órgãos internos, sem o aparecimento de lesões (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; OMS, 2005; BOTTINO et al, 2006). Num período compreendido entre 4 a 10 semanas após a infecção inicial, ocorre a fase secundária (Fig.20 e 21), sendo possível que incidam concomitantemente às lesões da sífilis primária. Em pele, as lesões ocorrem por surtos, simetricamente, apresentando-se sob as formas de máculas eritematosas (roséola sifilítica) de curta duração. Surtos posteriores podem apresentar-se como lesões em forma de pápulas eritema-acobreadas, arredondadas, de superfície plana, com discreta descamação na periferia (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; OMS, 2005; SARACENI et al, 2005; BOTTINO et al, 2006; MS, 2006; REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009).
72
Figura 20 - Sífilis secundária - Pápulas sifilíticas em pele Fonte: Laskaris et al. 2004.
As lesões bucais dessa fase são caracterizadas clinicamente por placas mucosas, exantema, condiloma plano, múltiplas áreas infectantes de pápulas ou úlceras, podendo ocorrer em qualquer superfície da mucosa bucal. Placas mucosas, encontradas em 30% dos pacientes que chegam à fase secundária, são caracterizadas por regiões esbranquiçadas que podem fusionar-se e resultar em necrose epitelial superficial, causando descamação do tecido e exposição do tecido conjuntivo cruento subjacente. Essas lesões podem ser observadas com mais freqüência em língua, lábios, mucosa jugal e palato. Simultaneamente ao aparecimento das lesões, observam-se manifestações sistêmicas como linfoadenopatia indolor, dor de garganta, cefaléia, indisposição, perda de peso, febre e dores musculoesqueléticas (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; LEÃO et al, 2007; NEVILLE et al, 2009).
Figura 21 - Sífilis secundária - Placas mucosas em mucosa jugal e lábio Fonte: Laskaris et al. 2004.
73
Lesões decorrentes da fase secundária da sífilis apresentam resolução espontânea de 3 a 12 semanas após seu aparecimento, no entanto, o paciente que permanece sem tratamento corre risco de desenvolver manifestações bucais terciárias da doença e lesões inflamatórias no sistema cardiovascular e no sistema nervoso central (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; NEVILLE et al, 2009). Entre os estágios secundário e terciário, há um período de latência, livre de lesões e sintomas, denominada sífilis latente. Esse período de latência tem tempo indeterminado e é dividido em duas fases: sífilis latente recente e sífilis latente tardia, podendo durar de 1 a 30 anos (OMS, 2005; SARACENI et al, 2005; MS, 2006; REGEZI et al, 2008). A fase latente recente tem início a partir do momento em os sintomas da sífilis secundária desaparecem até o final do segundo ano da doença. A partir desse período, denomina-se fase latente tardia. Se não diagnosticada e tratada, resultará em acometimento de outros sítios e órgãos, caracterizando, então, a sífilis terciária (Fig. 21). Dentre os pacientes não tratados, cerca de 30% a 40% desenvolvem a sífilis terciária, estágio em que complicações mais sérias são observadas (OMS, 2005; SARACENI et al, 2005; MS, 2006; REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). A sífilis terciária ou neurológica pode evoluir ao ponto de incluir as condições de ataxia motora, alterações inflamatórias do sistema cardiovascular - aneurisma da aorta ascendente, hipertrofia ventricular esquerda, regurgitação aórtica e insuficiência cardíaca congestiva; lesões granulomatosas (gomas) que podem afetar qualquer órgão, e tabes dorsalis - paralisia generalizada, psicose, demência, paresia e morte (REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). Focos dispersos das lesões granulomatosas podem atingir pele, mucosa, tecidos moles, ossos e órgãos internos. Lesões bucais decorrentes da goma apresentam-se como lesões endurecidas, nodulares ou ulcerativas, que geralmente causam a destruição de tecidos moles e/ou duros (palato ou língua). Quando localizadas em língua, apresentam aspecto lobulado difuso, e com forma irregular, denominada glossite intersticial. As lesões palatais são típicas e podem resultar em perfurações para a cavidade nasal (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; LEÃO et al, 2007; NEVILLE et al, 2009).
74
Figura 22 - Sífilis terciária - Perfuração do palato duro Fonte: Laskaris et al. 2004.
A sífilis, em qualquer um dos seus estágios, é tratada com eritromicina, tetraciclina ou penicilina; sendo o último medicamento o de escolha (MS, 2006; REGEZI et al, 2008). O tratamento parentérico com penicilina é preferível ao tratamento por via bucal, pois é necessário atingir níveis bactericidas no soro e no líquido cefalorraquidiano (LCR) para que o tratamento seja efetivo. A dose e o tempo de tratamento dependem do estadiamento da doença (Quadro 3) (OMS, 2005; SARACENI et al, 2005; MS, 2006).
75
Quadro 4- Tratamento da sífilis com base no estadiamento da doença Estadiamento
Penicilina G
Intervalo entre
Controle de cura
Benzatina
as séries
(sorologia)
Dose única
VDRL mensal
1 semana
VDRL mensal
1 semana
VDRL mensal
1 série Dose Sífilis primária
total: 2.400.000 UI
Sífilis secundária ou latente com menos de 1 ano de evolução
2 séries Dose total: 4.800.000 UI
Sífilis terciária ou com mais de
3 séries Dose
um ano de
total: 7.200.000
evolução ou com
UI
duração ignorada Fonte: MS, 2006/SARACENI et al, 2005
2.4.5.1.4.1.1.2
SÍFILIS EM PACIENTES HIV
Todos os pacientes com sífilis devem ser incentivados a fazer os testes de HIV, pois há uma considerável probabilidade de haver coinfecção (OMS, 2005). Devido à comum via de contágio, lesões ulcerativas decorrentes da sífilis podem aumentar o risco de contrair o HIV (BOTTINO et al, 2006). Em estudos realizados nos EUA, observou-se que 27,5% dos homens e 12,4% das mulheres HIV-positivo eram também portadores de sífilis (BOTTINO et al, 2006). Quando ambas as condições estão presentes (HIV e sífilis), algumas alterações podem ser observadas no padrão de aparecimento das lesões sifilíticas. Lesões primárias de sífilis aparecem como múltiplas lesões, ao invés de serem únicas como nos casos da doença isolada; além de serem mais comuns, nesses casos, lesões ulcerativas com freqüente acometimento ocular e bucal (BOTTINO et al, 2006; MS, 2006).
76
Alterações também podem ser encontradas nos testes sorológicos do HIV, em que a titulação poderá apresentar-se em níveis muito altos ou muito baixos, além de serem verificadas respostas sorológicas ao VDRL falso-positivas em pacientes com HIV (SARACENI et al, 2005; BOTTINO et al, 2006; MS, 2006). 2.4.5.1.4.1.2
TUBERCULOSE
Em conseqüência à epidemia pelo HIV a partir de 1980, houve uma significativa reincidência de tuberculose no mundo. A condição é ocasionada pelo bacilo aeróbico Mycobacterium tuberculosis, transmitido por perdigotos contaminados transportados pelo ar para os alvéolos pulmonares. A infecção requer, no entanto, que haja um contato próximo prolongado para que o hospedeiro saudável seja suscetível à fonte de infecção. Em casos de relação com pacientes com HIV/AIDS, no entanto, bactérias atípicas como M. avium-intracellulare, M. scrofulaceum e M. kansasii, M. bovis, M. africanum, M. haemophilum podem ocasionar o quadro (GREENBERG et al, 2008; SCULLY et al, 2008; REGEZI et al, 2008; CARTER et al, 2009; CHADE et al, 2009; NEVILLE et al, 2009; CEZAR et al, 2012). A infecção inicial pelo bacilo pode progredir para inúmeros quadros diferentes dependendo da extensão de exposição do M. tuberculosis no organismo e da resistência do hospedeiro. Os quadros podem ser classificados, conforme suas características em fase primária assintomática, fase primária sintomática, tuberculose primária progressiva e reativação da tuberculose (fase secundária). O risco de um indivíduo HIV-soronegativo desenvolver qualquer um dos estágios da tuberculose ao longo da vida é de 5% a 10% (GREENBERG et al, 2008; CARTER et al, 2009; CHADE et al, 2009). A tuberculose primária assintomática ocorre sem manifestações clínicas. Ocorre em indivíduos não expostos previamente à bactéria, sendo que o primeiro contato ocorre, comumente, por meio de disseminação direta de gotículas contaminadas entre dois indivíduos, envolvendo geralmente o pulmão. O bacilo M. tuberculosis não é um microorganismo altamente contagioso, pois não sintetiza exotoxinas ou enzimas extracelulares potentes, além de não ser protegido por uma cápsula antifagocitária. A infecção parece estar relacionada à habilidade do bacilo em multiplicar-se nos tecidos e células hospedeiras sem que haja defesa do organismo infectado (GREENBERG et al, 2008; REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009).
77
Pacientes nessa fase da doença apresentam uma reação positiva à tuberculina, indicando que o organismo foi infectado, porém desenvolveu imunidade contra a bactéria. Essa reação imunológica previne que o microorganismo dissemine-se no hospedeiro. Essa condição, no entanto, não é estática, podendo haver reativação do bacilo em casos de comprometimento imunológico (GREENBERG et al, 2008; CARTER et al, 2009). Na tuberculose primária sintomática, o M. tuberculosis é disseminado por via linfática provocando, então, uma resposta inflamatória granulomatosa inespecífica, tendo como resultado inicial a formação de um nódulo localizado fibrocalcificado no local da inoculação inicial. O microorganismo pode permanecer nos focos da lesão na forma latente por vários anos, podendo ser reativado posteriormente (GREENBERG et al, 2008; REGEZI et al, 2008; CARTER et al, 2009; NEVILLE et al, 2009). As lesões resultantes da tuberculose primária sintomática geralmente acometem o ápice pulmonar, no entanto, podem difundir-se para outros sítios. A condição é caracteristicamente assintomática, com alterações subclínicas, gerando ocasionalmente febre e efusão pleural (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). Em pacientes mais imunocomprometidos pode desenvolver-se uma condição mais séria da tuberculose, a tuberculose primária progressiva. Nesses pacientes, os microorganismos disseminam-se por todo o organismo do hospedeiro por via sanguínea, resultando em pequenos múltiplos sítios, denominada tuberculose miliar; pelo sistema gastrointestinal e por via respiratória, induzindo a broncopneumonia. Na tuberculose miliar, focos de infecção ocorrem em órgão e tecidos distantes, sendo mais freqüentes nas meninges, pulmões, fígado e córtex renal (GREENBERG et al, 2008). A reativação ocorre em indivíduos que desenvolveram a tuberculose primária e estão assintomáticos. Ocorre em cerca de 5% a 10% dos pacientes e em decorrência do comprometimento do sistema imune do hospedeiro, como em casos de diabete melito, uso de medicamentos imunossupressores, idade avançada, pobreza e AIDS, sendo o último o fator de maior risco para progressão da doença (GREENBERG et al, 2008; REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009; SEISCENTO et al, 2012). Nesse estágio da doença podem-se observar sinais e sintomas de febre baixa, indisposição, inapetência, perda de peso, sudorese noturna e, com o agravamento do quadro, tosse, hemoptise e dor torácica.
78
Dependendo dos órgãos atingidos pelos bacilos, diversos quadros clínicos podem ser encontrados (REGEZI et al, 2008; CARTER et al, 2009; NEVILLE et al, 2009; SCULLY et al, 2009).
Pacientes expostos à bactéria M. tuberculosis podem desenvolver a condição primária da doença, que manifesta sintomas pulmonares. O organismo do hospedeiro, quando saudável, reage, fazendo com que os bacilos fiquem latentes e a infecção seja paralisada. Em um contexto de imunossupressão, os bacilos podem sofrer reativação, ocasionando a tuberculose secundária. Pacientes que contraem a infecção primária, porém são imunossuprimidos ou aqueles que se tornam imunossuprimidos após a sua reativação, podem desenvolver a tuberculose progressiva, com disseminação hematogênica e linfática (NEVILLE et al, 2009). As manifestações orais da tuberculose ocorrem em cerca de 3% dos casos envolvendo infecção pulmonar e/ou sistêmica prolongada. As lesões bucais geralmente seguem à tuberculose reativada ou secundária, sendo tipicamente secundária à doença pulmonar e seguidas à implantação do M. tuberculosis, a partir de escarro contaminado em qualquer superfície da mucosa. As lesões são caracteristicamente úlceras necróticas, crônicas, indolores, que não cicatrizam. Geralmente localizam-se em língua, gengiva e palato, embora possam incidir em qualquer local da mucosa bucal (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; LEÃO et al, 2007; GREENBERG et al, 2008; REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009).
79
Figura 23 – Tuberculose – Úlcera em dorso de língua Fonte: Laskaris et al. 2004.
Figura 24 - Tuberculose – Úlcera em mucosa jugal Fonte: Laskaris et al. 2004.
Fica claro que a progressão da infecção por bacilos para estágios mais severos ocorre na ausência de uma resposta imunológica adequada à infecção. A habilidade de um indivíduo infectado, portanto, desenvolver uma resposta imune contra os antígenos do bacilo M. tuberculosis influencia enormemente no início e progressão da doença (GREENBERG et al, 2008). Atualmente o tratamento é realizado com múltiplos antibióticos para garantir a penetração nos tecidos e minimizar a resistência dos microorganismos. As diretrizes para o tratamento incluem um intervalo de tratamento de longa duração e adesão do paciente. Para o tratamento de pacientes com tuberculose ativa é realizada combinação de 3 ou mais fármacos, escolhidos de acordo com a natureza e sítio da doença. São tipicamente utilizados a isoniazida, a rifampicina, a pirazinamida e o
80
etambutol, a menos que seja percebida resistência a esses medicamentos. Pode-se realizar imunização para o bacilo a partir da vacinação contra a tuberculose (BCG – Bacilo de Calmette-Guérin). Ela não impede a infecção e o desenvolvimento da doença pulmonar, porém pode proteger contra a disseminação da doença (GREENBERG et al, 2008; CEZAR et al, 2012). 2.4.5.1.4.1.2.1
TUBERCULOSE EM PACIENTES HIV
A tuberculose é atualmente a primeira causa de morte entre pacientes HIV-soropositivos. A prevalência de tuberculose ativa em pacientes com AIDS é de 21 a 100 vezes maior do que documentado na população em geral. Por esse motivo, apresentam maior chance de manifestarem lesões bucais como consequência da doença. O risco de adoecimento entre pacientes HIV-positivo por tuberculose é de 20 a 37 vezes maior, sendo que 25% das mortes entre pessoas que tem AIDS são em conseqüência da tuberculose (CARTER et al, 2009; NEVILLE et al, 2009; CEZAR et al, 2012; SEISCENTO et al, 2012). A manifestação da tuberculose, em seus mais variados graus, oscila de acordo com o grau de supressão imunológica decorrente da infecção por HIV. Estágios iniciais da doença, em que a contagem de T CD4+ é elevada, não causam mudanças significativas na forma de apresentação da tuberculose. Formas graves, como a extrapulmonar e a disseminada, estão relacionadas com uma baixa contagem desses linfócitos, geralmente chegando a valores inferiores a 500 células/mm³ (SEISCENTO et al, 2012). Estudos científicos observaram que a tuberculose pode causar uma diminuição da contagem de células T CD4+ e aumento da carga viral do HIV, podendo tornar a condição mais grave (CARTER et al, 2009). 2.4.5.1.4.2
DOENÇAS VIRAIS EM PACIENTES HIV
Embora não haja lesões bucais específicas causadas pelo HIV, o paciente pode apresentar diversas manifestações bucais como sinais precoces da doença. Microorganismos frequentemente associados ao HIV que se manifestam a partir de lesões bucais recorrentes são: herpes simples (HSV), citomegalovirus (CMV), varicela zoster (VZV) epsteinbarr (EBV) e papiloma (HPV) (BALFOUR et al, 2004; FIQUERO et al, 2007; GREENBERG et al, 2008; REGEZI et al, 2008).
81
O HSV intrabucal e labial é uma manifestação bastante freqüente em pacientes imunocomprometidos. A taxa de prevalência de HSV, quando há coinfecção pelos dois vírus, varia de 10% a 15%. As lesões, nesses casos, são maiores, mais amplamente distribuídas, dolorosas e destrutivas e demoram mais tempo para regredir. Tendem a ser mais recorrentes e significativas a partir do 4º estágio clínico da infecção por HIV. Infecções bacterianas secundárias às lesões de herpes, nesses casos, são bastante freqüentes (LASKARIS et al, 2004; WHO, 2005; GREENBERG et al, 2008; REGEZI et al, 2008).
Figura 25 – Infecção por HIV – Herpes simples em palato Fonte: Laskaris et al. 2004.
O CMV é um dos patógenos oportunistas mais importantes em pacientes imunocomprometidos. As manifestações clínicas decorrentes da infecção por CMV dependem do nível de supressão imunológica que o paciente apresenta. A supressão progressiva resultante da infecção pelo HIV aumenta a atividade do CMV (JUNQUEIRA et al, 2008). Pacientes coinfectados pelos HIV e CMV podem desenvolver, em algum período do curso da doença AIDS, retinite por CMV, esofagites, colites, pneumonite, hepatite, adrenalite entre outras condições. Úlceras bucais esporádicas, geralmente únicas, não-específicas também são observadas, geralmente quando a contagem das células CD4+ está inferior a 100 células/mm³. Essas lesões não são precedidas por vesículas, são bastante dolorosas e tendem a cicatrizar apenas parcialmente (LASKARIS et al, 2004; GREENBERG et al, 2008; JUNQUEIRA et al, 2008). Infecções recorrentes por VZV são bastante comuns em pacientes HIV-positivos, principalmente em contagem de células CD4+ inferiores a 200 células/mm³. Em um estudo realizado por Sharma et al (2004), constatou-se que 91% dos casos de herpes zoster relatados estavam
82
relacionados a pacientes HIV-positivos. Em estágios iniciais, em que há pouca imunossupressão, o herpes zoster geralmente fica confinado a um dermátomo – semelhante a pacientes sadios. Na fase clínica de AIDS, no entanto, ocorre uma distribuição dérmica, podendo haver disseminação cutânea subseqüente. Lesões bucais apresentam-se clinicamente como vesículas de rápida ruptura, resultando em úlceras múltiplas, superficiais e pequenas, com halo eritematoso, distribuídas unilateralmente ao longo do 5º nervo craniano. Em situações de maior imunocomprometimento, apresenta envolvimento grave, geralmente ocasionando a formação de seqüestros ósseos, perda dentária e dor intensa (SHARMA et al, 2004; GREENBERG et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). Os vírus EBV e o HPV também estão bastante associados a condições de imunossupressão causadas pelo HIV. Estão relacionados a inúmeras manifestações incluindo: mononucleose, linfoma de Burkitt, carcinoma nasofaríngeo e leucoplasia pilosa, verruga vulgar, hiperplasia epitelial focal, condiloma acuminado e papiloma escamoso bucal. Não estão relacionados, no entanto, com lesões bucais ulcerativas (LASKARIS et al, 2004; GREENBERG et al, 2008; REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). 2.4.5.1.4.3
2.4.5.1.4.3.1
ULCERAÇÕES NÃO-ESPECÍFICAS EM PACIENTES HIV ÚLCERAS AFTOSAS EM PACIENTES HIV
Lesões clinicamente semelhantes às ulcerações aftosas ocorrem com elevada frequência em pacientes com HIV. Nesses pacientes podem ser observadas as 3 formas: menor, maior e herpetiforme (descritas no tópico 2.4.1 ÚLCERAS IDIOPÁTICAS – 2.4.1.1 ÚLCERAS AFTOSAS RECORRENTES). Aproximadamente 2/3 dos pacientes que apresentam UAR decorrentes da infecção pelo HIV manifestam as formas maior e herpetiforme, incomuns em pacientes sadios (LASKARIS et al, 2004; NEVILLE et al, 2009).
83
Figura 26 - Infecção por HIV - Úlcera aftosa recorrente em lábio Fonte: Laskaris et al. 2004.
Figura 27 - Infecção por HIV - Ulceração herpética recorrente Fonte: Neville et al. 2009.
Figura 28 - Infecção por HIV - Ulceração aftosa recorrente Fonte: Neville et al. 2009.
84
Estudos indicam que muitos pacientes soropositivos que relatam episódios de UAR, apresentaram episódios recorrentes das úlceras na infância, que regrediram na vida adulta, voltando a manifestarem-se após a infecção pelo vírus (MIZIARA et al, 2005). Em um estudo realizado por Miziara et al (2005), com 94 pacientes soropositivo (25 mulheres e 69 homens), portadores de UAR, foi observado que 29,03% apresentavam apenas UAR maiores, 40,32% apenas UAR menores e 16,12% apenas herpetiformes. O restante dos pacientes apresentava outros tipos de UAR relacionadas à doença sistêmica (MIZIARA et al, 2005). A contagem de linfócitos T CD4+ e CD8+ e a carga viral estão significativamente relacionadas com o tipo de UAR presente. Pacientes com UAR maiores apresentaram contagem de linfócitos menor e maior carga viral que pacientes com UAR dos tipos menor e herpetiforme (MIZIARA et al, 2005). O uso de novas drogas antirretrovirais tem prolongado a sobrevida dos pacientes com AIDS. Por isso, se faz necessário tratar e diminuir a morbidade causada pelas UAR, pois as lesões impedem que o paciente coma e fale adequadamente, gerando deficiências nutricionais e redução da qualidade de vida. O cirurgião-dentista deve ficar atento ao aparecimento de UAR atípicas ou muito recorrentes, pois podem ser indicativas de imunocomprometimento relacionado à infecção pelo HIV (MIZIARA et al, 2005; JUANES et al, 2008; SCULLY et al, 2009). 2.4.5.2 DOENÇAS FÚNGICAS 2.4.5.2.1
PARACOCCIDIOIDOMICOSE
A paracoccidioidomicose (Fig.29) é uma infecção fúngica profunda, crônica granulomatosa causada pelo fungo dimórfico Paracoccidioides brasiliensis. Essa doença sistêmica é observada com maior freqüência em países da América do Sul – fundamentalmente Brasil, Argentina, Venezuela e Colômbia; sendo considerada endêmica nessas áreas. No Brasil, as áreas endêmicas são os estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Paraná, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Alguns estudos incluem a esse grupo o estado de Santa Catarina (LASKARIS et al, 2004; YASUDA et al, 2006; ANASTÁCIO et al, 2007; FRANÇA et al, 2008; TOLENTINO et al, 2010; GUERRERO et al, 2011; VIEIRA et al, 2011;). Há muito tempo estuda-se o habitat natural do fungo. A partir de estudos realizados desde 1986, constatou-se de 20% a 75% de tatus
85
silvestres capturados nas mais variadas regiões da América do Sul eram portadores do P. brasiliensis. Não existem evidências que o animal seja o transmissor da doença para seres humanos, porém ele pode ser o responsável pela dispersão dos microorganismos no ambiente (MARQUES et al, 2003; NEVILLE et al, 2009). Acredita-se que cerca de 50% dos indivíduos residentes de regiões endêmicas já tenha sido exposto ao agente infeccioso dessa doença. Estima-se atualmente que 10 milhões de indivíduos do mundo estejam infectados, dos quais 2% manifestem a doença. No Brasil, estima-se que haja de 1 a 3 casos da doença a cada 100 mil habitantes, sendo considerada a 8ª causa de morte entre doenças infecciosas e parasitárias (YASUDA et al, 2006; ANASTÁCIO et al, 2007; FRANÇA et al, 2008; NEVILLE et al, 2009; TOLENTINO et al, 2010; GUERRERO et al, 2011; VIEIRA et al, 2011). O sexo masculino é o mais acometido, numa proporção de 15:1, principalmente entre fumantes e/ou etilistas crônicos. A doença acomete, em sua maioria, trabalhadores rurais entre 30 e 50 anos de idade. Acredita-se que seja o estrogênio (β-estradiol) presente no corpo feminino que iniba a transformação dos fungos para forma patogênica (YASUDA et al, 2006; ANASTÁCIO et al, 2007; TOLENTINO et al, 2010; GUERRERO et al, 2011; VIEIRA et al, 2011). O microorganismo é transmitido por meio de inalação de propágulos infecciosos presentes no solo, podendo acontecer também por penetração por mucosas bucal, faringeana ou intestinal (YASUDA et al, 2006; ANASTÁCIO et al, 2007; FRANÇA et al, 2008; GUERRERO et al, 2011). Quando dentro do indivíduo, o fungo transforma-se na forma leveduriforme, sua forma parasitária. O P. brasiliensis pode, então, disseminar-se por via hematogênica ou linfática para vários órgãos e tecidos. Apenas uma proporção bastante pequena dos indivíduos expostos desenvolve alguma manifestação clínica da doença. Quando presentes, no entanto, apresentam-se inicialmente como uma infecção pulmonar após a exposição aos esporos do microorganismo (YASUDA et al, 2006; ANASTÁCIO et al, 2007; NEVILLE et al, 2009). Diversas formas de manifestação podem estar relacionadas à paracoccidioidomicose, pois dependem dos fatores do agente patógeno e a resposta do hospedeiro. Três formas são conhecidas: pulmonar, mucocutânea e disseminada (LASKARIS et al, 2004; ANASTÁCIO et al, 2007). A doença primária (pulmonar) acontece em praticamente 75% dos casos, em que características de infecção respiratória, semelhantes a
86
um quadro de tuberculose, podem ser observadas. Nesse estágio podem observar-se radiograficamente lesões pulmonares dos tipos nodular, infiltrativa, fibrosa ou cavitária. Por via hematogênica ou linfática, o fungo dissemina-se pelo organismo do hospedeiro, podendo atingir qualquer órgão do corpo causando manifestações importantes em pulmões, linfonodos, suprarrenais, sistema osteoarticular, aparelho digestivo, fígado, baço e sistema nervoso central, incluindo lesões em mucosa bucal (MUNIZ et al, 2002; COSTA et al, 2005; FRANÇA et al, 2008; ANASTÁCIO et al, 2007; JHAM et al, 2008; TOLENTINO et al, 2010; GUERRERO et al, 2011). A forma mucocutânea ou tegumentar é a manifestação mais comum e caracteriza-se pelo aparecimento de lesões em mucosa bucal, gengiva, língua, palato mole, mucosa labial, nasal, faríngea e laríngea (TOLENTINO et al, 2010). As lesões bucais geralmente são a primeira manifestação perceptível da doença e apresentam-se clinicamente como úlceras dolorosas, irregulares, proliferativas, hipertróficas, de evolução lenta, superfície granular (aspecto moriforme), geralmente localizadas em palato mole e duro, língua e gengivas. Outras localizações como lábios, língua, orofaringe e mucosa jugal também podem ser observadas, porém em menor grau. Em casos mais graves pode ocorrer, inclusive, perfuração do palato. Sensações de ardor, prurido e sialorréia também podem ser observadas. As características clínicas são: perda de peso, febre, disfagia, tosse e enfartamento ganglionar (LASKARIS et al, 2004; BORTOLUZZI et al, 2008; FRANÇA et al, 2008; NEVILLE et al, 2009; VIEIRA et al, 2011).
Figura 29 - Paracoccidioidomicose - Úlcera irregular em lábio inferior Fonte: Neville et al. 2009.
87
Várias são as abordagens terapêuticas para tratar a paracoccidioidomicose. Por ser uma micose profunda, o tratamento deve ser realizado com medicamentos sistêmicos. Em estágios agudos, quando há risco de morte, o medicamento de escolha geralmente é a anfotericina B. O antifúngico itraconazol tem mostrado ser bastante eficaz no combate ao microorganismo quando não há risco de morte, observando-se significativa regressão das lesões bucais em poucos meses de tratamento. O tempo de tratamento total, no entanto, é longo, variando de 6 a 12 meses, com doses diárias de 200mg (FRANÇA et al, 2008; GUERRERO et al, 2011; VIEIRA et al, 2011).
88
3
DISCUSSÃO
O diagnóstico de úlceras e ulcerações bucais deve ser baseado, principalmente, na história e nas características clínicas da lesão. Devese observar durante o exame clínico seu número, persistência, formato, características das bordas, aparência da base, consistência e características extrabucais (SCULLY et al, 2009). Algumas características podem indicar uma possível origem sistêmica para essas úlceras, entre elas (TOCHE et al, 2007; SCULLY et al, 2009): Manifestações sistêmicas: lesões em outros órgãos como pele, globo ocular, genitais, presença de púrpura, febre, linfoadenopatias, hepatomegalia, esplenomegalia, tosse crônica, distúrbios gastrointestinais, inapetência, perda de peso, fraqueza, indisposição e sinais prodrômicos entre outras; História e comportamento das condições ulcerativas: etapa da vida em que ocorre seu surgimento, exacerbação e severidades, nãoresponsividade a corticóides tópicos como hidrocortisona e triancinolona; Relação com outras lesões: candidíase, herpes, glossite, petéquias, sangramento e inchaço gengival, leucoplasia pilosa e sarcoma de Kaposi. Exames complementares como exames de imagem, testes sanguíneos, microbiológicos e sorológicos podem ser indicados para investigação da sua possível causa (SCULLY et al, 2009). Esta discussão subclassificou as lesões ulcerativas em condições sistêmicas que causam (SCULLY et al, 2009): a. Ulceração única – relacionadas ou não à presença de febre; b. Ulcerações múltiplas relacionadas ao seu curso clínico: agudo ou recidivante; c. 3.1
Úlceras múltiplas relacionadas ao seu curso clínico: crônicas. DIAGNÓSTICO BASEADO NO NÚMERO DE CONDIÇÕES ULCERATIVAS
89
3.1.1
ULCERAÇÃO
3.1.1.1 ULCERAÇÃO ÚNICA Muitas condições sistêmicas podem ter como manifestação bucal uma única lesão ulcerada. Elas diferem em características clínicas como localização preferencial, presença ou não de halo eritematoso, presença de vesículas e bolhas antecedentes, presença ou ausência de sintomatologia dolorosa e sintomas sistêmicos de febre e linfadenopatia. Todos os fatores, quando associados e levados em consideração, ajudam a traçar um diagnóstico preciso. O diagnóstico diferencial será discutido a partir do número de úlceras e do sinal de febre. 3.1.1.1.1 3.1.1.1.1.1
ULCERAÇÃO ÚNICA COM AUSÊNCIA DE FEBRE ULCERAÇÃO ÚNICA RELACIONADA AO TRAUMATISMO
A maioria dos traumatismos é causada simplesmente por um estímulo mecânico. Geralmente a relação de causa e efeito é obvia, podendo estar associadas a próteses mucossuportadas mal adaptadas, aparelhos ortodônticos, dentes fraturados e injúrias elétricas, térmicas e químicas. Localizam-se preferencialmente em lábio inferior, língua e mucosa jugal. Estão associadas à queixa de dor, porém não estão relacionadas a sintomas sistêmicos como febre e linfadenopatia. Desaparecem cerca de uma semana após a remoção da causa (GOIATO et al, 2005; LIMA et al, 2005; PARANHOS et al, 2008; REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). 3.1.1.1.1.2
ÚLCERAS AFTOSAS RECORRENTES (UAR)
UAR menores e maiores podem apresentar-se como úlceras únicas ou múltiplas (FIELD; ALAN, 2003). Localizam-se, na forma menor, preferencialmente em mucosa bucal, lábios, língua, e fundo de sulco vestibular em quase 80% dos casos de UAR. Quando na forma maior, localizam-se preferencialmente em lábios e palato mole. Ambas as formas não estão relacionadas a sintomas sistêmicos de febre ou linfoadenopatia, sendo caracterizadas por serem dolorosas e circundadas por um halo eritematoso. Regridem espontaneamente duas a três semanas após seu aparecimento, podendo sofrer recorrência em intervalos de 1 a 5 meses (FRAIHA et al, 2002; GUIMARÃES et al,
90
2005; PERREIRA et al, 2006; WILHEMSEM et al, 2009). As UAR do tipo herpetiforme sempre aparecem em lesões pequenas e múltiplas (FRAIHA et al, 2002; PERREIRA et al, 2006; CURVELO et al, 2008). Há divergência entre os autores, no entanto, quanto ao tamanho das úlceras e sua classificação. Para Fraiha et al (2002) e Curvelo et al (2008) classificam-se como UAR menores, úlceras com até 5 mm de diâmetro. Para Scully et al (2003), Favaro et al (2005) e Guimarães et al (2005) e, no entanto, são classificadas como menores, úlceras de até 10mm de diâmetro (FRAIHA et al, 2002; SCULLY et al, 2003; FAVARO et al, 2005; GUIMARÃES et al, 2005; CURVELO et al, 2008). Um fator importante a ser considerado na avaliação das úlceras é a presença de cicatriz posteriormente à regressão da lesão. As UAR menores geralmente não deixam cicatriz. O tipo maior, no entanto, geralmente deixa cicatriz (CURVELO ET AL, 2008). Para Favaro (2005), a presença de cicatriz em local onde houve previamente úlcera é patognomônico de UAR maiores (FAVARO et al, 2005). O diagnóstico das UAR é realizado com base em critérios de achados clínicos e no histórico da doença, já que não existem exames laboratoriais disponíveis. A história médica do paciente deve ser exaustivamente pesquisada, pois as lesões estão fortemente associadas às condições sistêmicas que geram imunossupressão (AIDS) ou deficiências nutricionais (doença celíaca). Um exame sanguíneo completo deve sempre ser realizado para pesquisa de distúrbios imunológicos e deficiência nutricional de ferro e vitaminas (SCULLY et al, 2003). 3.1.1.1.1.3
ULCERAÇÃO ÚNICA RELACIONADA À SÍFILIS PRIMÁRIA
Uma lesão ulcerada única, indolor, sem inflamação perilesional, pode manifestar-se no estágio primário da sífilis. Localizam-se, preferencialmente, em lábio superior (mulheres), lábio inferior (homens) e, ocasionalmente, em gengiva, palato, língua e amígdalas. Apresenta remissão espontânea de duas a três semanas após seu aparecimento, sem estar relacionada a sintomas sistêmicos de febre e linfoadenopatia. Posteriormente ao desaparecimento das lesões, durante o período de latência, pode haver o desenvolvimento de linfadenopatia regional bilateral (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; SARACENI et al, 2005; OMS, 2005; BOTINO et al, 2006; MS, 2006; LEÃO et al, 2007).
91
A pesquisa de T. pallidum em campo escuro ou imunofluorescência das lesões (exame de campo escuro) na sífilis primária (cancro) e secundária (placas sifilíticas) é um método laboratorial rápido para estabelecer o diagnóstico. Esse exame apresenta sensibilidade de 75%, não sendo efetivo, no entanto, em lesões na cavidade bucal, devido à presença de espiroquetas saprófitas (SOARES et al, 2012). O teste de triagem indicado nesses casos é o VDRL (Veneral Disease Research Laboratory), um teste não-treponêmico. Esse teste apresenta algumas limitações como baixa sensibilidade na sífilis inicial e na sífilis latente, além de, resultados falso-positivos e falso-negativos (SCULLY et al, 2009; SOARES et al, 2012). Testes treponêmicos, como o FTA-ABS (Fluorescent Treponemal Antibody Absortion Test), são mais específicos e são utilizados para a confirmação do diagnóstico, principalmente em casos com evidência clínica da doença com testes não-treponêmicos negativos ou resultado positivo (SCULLY et al, 2009; SOARES et al, 2012). O diagnóstico da doença HIV pode ser realizado a partir de outros achados clínicos, como outras doenças sexualmente transmissíveis (DST). Ela deve ser sempre investigada na presença de um resultado positivo para sífilis (SCULLY et al, 2009). 3.1.1.1.2 3.1.1.1.2.1
ULCERAÇÃO ÚNICA COM PRESENÇA DE FEBRE ULCERAÇÃO ÚNICA RELACIONADA AO HERPES SIMPLES
A presença de uma única área ulcerada com mucosa normal remanescente pode ser indicativa de recorrência do HSV-1. As lesões são antecedidas por sinais prodrômicos, de 24 a 48 horas, como prurido, ardência, queimação e dor moderada. O local fica edemaciado e eritematoso. Segue-se o aparecimento de pequenas vesículas, que logo se rompem e formam úlceras pequenas e superficiais. Geralmente se localizam em lábios e região peribucal. Quando em região intrabucal, atingem comumente palato duro e gengivas (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; LASKARIS et al, 2004; LEÃO et al, 2007; GREENBERG et al, 2008; MAROTTI et al, 2008; CONSOLARO et al, 2009). Estão associadas à presença de febre e sintomatologia dolorosa, sendo, em algumas situações, necessária a administração de medicamentos antipiréticos e analgésicos (MAROTTI et al, 2008; CONSOLARO et al, 2009).
92
As lesões têm característica autolimitante e regridem espontaneamente dentro de 10 a 14 dias, podendo deixar cicatriz (MAROTTI et al, 2008; REGEZI et al, 2008; SCULLY et al, 2008; CONSOLARO et al, 2009). A identificação dos sinais prodrômicos permite que o paciente possa antecipar-se ao aparecimento das lesões, prevenindo lesões maiores e desconfortáveis. Pesquisas têm enfatizado que taxas mais altas de sucesso podem ser encontradas quando o diagnóstico é precoce. Quando diagnosticadas prontamente e realizada a devida terapêutica, as lesões clinicamente ativas podem até ser evitadas. O diagnóstico do herpes simples bucal recorrente é essencialmente clínico e deve ser realizado com a condução de uma anamnese detalhada, voltada para identificar sinais e sintomas compatíveis com a condição e exame físico meticuloso das lesões bucais (CONSOLARO et al, 2009; FERREIRA et al, 2011). Pacientes imunocomprometidos apresentam recorrências mais freqüentes, duradouras e exacerbadas, com características e sinais clínicos atípicos, sendo alvos mais comuns de infecções secundárias. O cirurgião-dentista deve ficar atento a essas manifestações anormais, pois podem indicar alguma outra condição associada às manifestações do herpes simples (CONSOLARO et al, 2009; FERREIRA et al, 2011). 3.1.2
ÚLCERA
3.1.2.1 ÚLCERA ÚNICA 3.1.2.1.1 3.1.2.1.1.1
ÚLCERA ÚNICA COM AUSÊNCIA DE FEBRE ÚLCERA ÚNICA RELATIVA À CEC EM ESTÁGIO INICIAL
Caso não haja remissão das lesões duas a três semanas após a remoção da causa, uma etiologia diferente de trauma deve ser considerada. Úlceras únicas persistentes em um único local, que provocam pouca ou nenhuma dor, sem halo eritematoso, podem ser indicativas de CEC nos estágios iniciais. Localizam-se, preferencialmente, em língua (lateral posterior), assoalho bucal ou lábio inferior. Fatores de risco como o consumo de tabaco e álcool devem ser investigados. Para o diagnóstico final deve ser realizada biópsia (NEVILLE; DAY, 2002; NEVILLE et al, 2009).
93
3.1.2.1.2 3.1.2.1.2.1
ÚLCERA ÚNICA COM PRESENÇA DE FEBRE ÚLCERA ÚNICA RELACIONADA À PARACOCCIDIOIDOMICOSE
Manifestações bucais dessa condição geralmente apresentam-se clinicamente como uma única úlcera dolorosa, persistente, de evolução lenta com sintomas sistêmicos de febre baixa, tosse, enfartamento ganglionar e perda de peso associados. Localizam-se preferencialmente em palato mole e duro, língua e gengivas. Regridem poucos meses após o inicio do tratamento com antifúngicos (LASKARIS et al, 2004; BORTOLUZZI et al, 2008; FRANÇA et al, 2008; NEVILLE et al, 2009; SCULLY et al, 2009; VIEIRA et al, 2011). O diagnóstico costuma ser feito com base na identificação das formas típicas do fungo Paracoccidioides brasiliensis. As principais amostras clínicas coletadas para identificação do microorganismo são escarro, lavado broncoalveolar, aspirado de linfonodos, secreções de lesões mucocutâneas e biópsia. Outra técnica de diagnóstico pode ser utilizada, a detecção de anticorpos específicos contra a glicoproteína 43 KDa (gp43), altamente antigênica do P. brasiliensis. Há a confirmação quando duas amostras de soro consecutivas derem positivas. Utiliza-se também um antígeno extraído da parede celular do fungo, denominada paracoccidioidina, aplicada em teste intradérmico. Essa forma diagnóstica é contraindicada, pois tem baixa especificidade e não diferencia doença ativa e contato prévio com a doença (GUERRERO et al, 2011; VIEIRA et al, 2011; SOARES et al, 2012). As manifestações bucais da paracoccidioidomicose são geralmente os primeiros sinais perceptíveis da doença. Por esse motivo, é de extrema importância que o cirurgião-dentista seja capaz de identificar essas lesões para que o diagnóstico final possa ser realizado (BORTOLUZZI et al, 2008). 3.1.2.1.2.2
ÚLCERA ÚNICA RELACIONADA À TUBERCULOSE
A presença de uma única área ulcerada pode ser indicativa de uma úlcera decorrente de infecção por tuberculose. As lesões bucais da tuberculose geralmente seguem à reativação da tuberculose, seguidas à implantação do M. tuberculosis na cavidade bucal em conseqüência do escarro contaminado. As lesões são caracteristicamente úlceras necróticas, crônicas, indolores, que não cicatrizam. Geralmente
94
localizam-se em língua, gengiva e palato, embora possam incidir em qualquer local da mucosa bucal (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; LEÃO et al, 2007; GREENBERG et al, 2008; REGEZI et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). Sintomas de febre baixa, indisposição, inapetência, perda de peso, sudorese noturna e tosse podem estar presentes concomitantemente ao aparecimento das lesões bucais (CARTER et al, 2009; SCULLY et al, 2009). O diagnóstico pode ser fundamentado em diversos métodos: bacterioscópicos de baciloscopia ou cultura, radiológico, tomografia computadorizada de tórax, broncoscopia, prova de tuberculina cutânea, anatomopatológico, sorológico, bioquímico e molecular (MS, 2005). O método prioritário é a baciloscopia direta do escarro, em que uma análise microscópica é realizada para detecção do microorganismo. Nesse método, o profissional coleta, em um frasco estéril, três amostras, em dias consecutivos ou alternados, o primeiro escarro da manhã após a higiene bucal. A amostra deve ser encaminhada para um laboratório em temperatura ambiente até 2 horas após a coleta, ou até 48 horas sob refrigeração (2 – 8ºC). O método de coloração utilizado é a coloração de Ziehl-Neelsen ou Coloração de BAAR (MS, 2005; SOARES et al, 2012). O resultado é considerado negativo quando não forem encontradas amostras de BAAR em 100 campos observados. O resultado positivo está relacionado a qualquer quantidade de BAAR encontrada em 100 campos observados (SOARES et al, 2012). Pacientes que apresentarem alterações pulmonares na radiografia de tórax ou que tiverem contato prévio com pacientes com tuberculose primária, devem ser submetidos a esse exame (MS, 2005). O exame radiológico de tórax auxilia no diagnóstico, sendo necessário sempre que houver suspeita de tuberculose. A imagem de tórax permite a identificação de alterações sugestivas de tuberculose nas fases primária e secundária. Pacientes que deram positivo para a baciloscopia são submetidos ao exame radiológico para exclusão de outra doença pulmonar associada que necessite de tratamento concomitante. A tomografia computadorizada é indicada nos casos em que houver resultados imprecisos na radiografia de tórax, principalmente quando a baciloscopia der negativa e outras condições tiverem que ser investigadas. Devido ao alto custo, no entanto, deve ser indicada de forma individualizada (MS, 2005). A prova tuberculínica deve ser realizada somente em pessoas não vacinadas com BCG. O resultado positivo indica que houve infecção por micobactérias, porém não confirma a presença da doença. Esse exame,
95
portanto, deve ser utilizado com cautela, tendo em vista suas limitações na conclusão do diagnóstico (MS, 2005). Nas lesões extrapulmonares, como nos casos de lesões bucais, deve-se sempre realizar biópsia, para que haja identificação do bacilo ou um processo inflamatório compatível com a tuberculose (MS, 2005). Todos os pacientes com diagnóstico confirmado de tuberculose devem ser submetidos ao exame sorológico anti-HIV. A imunossupressão causada pela infecção pelo HIV desencadeia a tuberculose com maior facilidade, sendo uma doença indicativa da AIDS (MS, 2005). O cirurgião-dentista deve ficar atento, portanto, para o aparecimento de lesões indicativas da infecção por tuberculose, atentando para o fato de que a coinfecção pelo HIV pode apresentar manifestações diferenciadas da tuberculose, de acordo com o grau de imunossupressão (SEISCENTO et al, 2012). A imunização contra o bacilo pode ser realizada ainda na infância a partir da aplicação da vacina BCG. Pacientes adultos sintomáticos ou assintomáticos ou portadores de imunodeficiências congênitas ou adquiridas não podem ser vacinados (MS, 2005). 3.1.2.2 ÚLCERAS/ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS Úlceras/Ulcerações múltiplas e persistentes são fortemente associadas a desordens sistêmicas. O grupo de lesões ulceradas múltiplas pode ser dividido em ulcerações e úlceras de curso clínico agudo ou crônico. 3.1.2.2.1
ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS
3.1.2.2.1.1
3.1.2.2.1.1.1
ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS DE CURSO CLÍNICO AGUDO ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS RELACIONADAS A GENGIVOESTOMATITE HERPÉTICA AGUDA (GEHA)
A GEHA é a primo-infecção causada pelo HSV-1. Os pacientes geralmente aparecem com a doença totalmente desenvolvida, com histórico de sintomas prodrômicos generalizados que precedem as lesões bucais em 1 ou 2 dias, sem aparecimento prévio de lesões de recorrência de herpes simples. Outras condições como alergias e eritema
96
multiforme apresentam a manifestação das lesões bucais e os sinais sistêmicos concomitantemente (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; GREENBERG et al, 2008). Os sintomas prodrômicos são: febre, cefaléia, indisposição, náusea, vômito e linfoadenopatia cervical. Após 1 a 2 dias, há o aparecimento de áreas focais vesiculares, circundadas por um halo eritematoso, espalhadas por todas as regiões da cavidade bucal que terminam por romperem-se e originarem úlceras discretas, rasas e dolorosas. Essas úlceras podem coalescer, formando úlceras grandes e irregulares, recobertas por uma fibrina amarela. Aliado a essas lesões, há o aparecimento da gengivite marginal aguda generalizada, caracterizada pela presença de inflamação, edema e pequenas úlceras por toda a gengiva (GREENBERG et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). A condição é autolimitante em pacientes sadios, cicatrizando cerca de 10 dias após o aparecimento das lesões. Por geralmente apresentarem-se tipicamente e serem autolimitantes, testes laboratoriais raramente são solicitados para realização do diagnóstico. Em casos atípicos, no entanto, é muito importante que se faça a diferenciação entre a GEHA e o eritema multiforme. Nessas situações pode-se fazer citologia esfoliativa da base de uma vesícula para realização do diagnóstico (GREENBERG et al, 2008). 3.1.2.2.1.1.2
ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS RELACIONADAS A VARICELA ZOSTER
Ulcerações bucais causadas pelo VZV na infecção primária (catapora) são raras e apresentam-se comumente como erupções maculopapulares que se desenvolvem em vesículas unilaterais com base eritematosa. As lesões em pacientes sadios são autolimitantes, não sendo comum a necessidade de realização de diagnóstico (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; LASKARIS et al, 2004; GREENBERG et al, 2008; SCULLY et al, 2008; FBP, 2011). As lesões bucais causadas pelo VZV na infecção recorrente (herpes zoster) são precedidas por sinais prodrômicos, de 2 a 4 dias antes, como dor repentina, parestesia, queimação e flacidez tecidual ao longo do nervo afetado. Vesículas unilaterais de curta duração, compatíveis com o envolvimento de um único dermátomo, aparecem em cachos ao longo do trajeto do nervo. As lesões do herpes zoster lembram as do herpes simples, tendo como diferença presença de dor através do curso de um ramo do nervo trigêmio e lesões ipsilaterais e segmentadas (REGEZI; SCIUBBA; POGREL, 2002; GREENBERG et al, 2008).
97
Pode-se realizar citologia das lesões vesiculares ou titulação de anticorpos em casos que não haja erupções. Há relatos de endodontias, exodontias ou outras cirurgias realizadas desnecessariamente ainda na presença dos sinais prodrômicos ou no zoster sem erupções. O cirurgião-dentista deve estar atento, portanto, aos sinais e sintomas relatados pelo paciente, para que um correto diagnóstico seja realizado e procedimentos desnecessários não sejam realizados (GREENBERG et al, 2008). 3.1.2.2.1.1.3
ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS RELACIONADAS A HERPANGINA
Lesões bucais decorrentes da herpangina geralmente começam a manifestar-se 2 a 10 dias após a exposição ao vírus. Concomitantemente ao aparecimento das lesões, aparecem sintomas generalizados semelhantes ao de gripe, como febre, calafrios, inapetência, cefaléia e indisposição. Esses sintomas mostram-se mais brandos do que os experimentados na GEHA (LASKARIS et al, 2004; AZANERO et al, 2006; GREENBERG et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). Em comparação com as lesões bucais decorrentes do HSV, as lesões da herpangina apresentam-se menores, geralmente localizadas em palato mole e pilares amigdalianos. A ausência de lesões em lábios, gengiva e assoalho bucal é uma importante característica, já que lesões por HSV geralmente atingem a porção anterior da cavidade bucal (GREENBERG et al, 2008; NEVILLE et al, 2009). Assim com o herpes simples, as lesões bucais decorrentes da herpangina também são autolimitantes. Sofrem regressão 7 a 10 dias após seu aparecimento. Além disso, após o contágio, o indivíduo produz imunidade persistente ao vírus, não sendo mais suscetível a novos episódios da condição (AZANERO et al, 2006; REGEZI et al, 2008). 3.1.2.2.1.1.4
ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS RELACIONADAS À SÍFILIS SECUNDÁRIA
As lesões bucais desse estágio da sífilis caracterizam-se por serem múltiplas áreas ulceradas geralmente localizadas em língua, lábios, mucosa jugal e palato. Uma característica marcante são regiões esbranquiçadas de descamação do tecido epitelial que envolve as ulcerações. Aparecem concomitantemente a manifestações sistêmicas de linfoadenopatia indolor, dor de garganta, cefaléia, indisposição, perda de peso, febre e dores musculoesqueléticas (REGEZI; SCIUBBA;
98
POGREL, 2002; LEÃO et al, 2007; NEVILLE et al, 2009). Apresentam remissão espontânea 3 a 12 semanas após seu aparecimento (OMS, 2005; SARACENI et al, 2005; MS, 2006). O teste de triagem indicado, nesses casos, é o VDRL (Veneral Disease Research Laboratory), um teste não-treponêmico. Esse teste apresenta algumas limitações como baixa sensibilidade na sífilis inicial e na sífilis latente; resultados falso-positivos e falso-negativos (SCULLY et al, 2009; SOARES et al, 2012). Testes treponêmicos, como o FTA-ABS (Fluorescent Treponemal Antibody Absortion Test), são mais específicos e são utilizados para a confirmação do diagnóstico, principalmente em casos com evidência clínica da doença com testes não-treponêmicos negativos ou resultado positivo (SCULLY et al, 2009; SOARES et al, 2012). 3.1.2.2.1.2
ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS DE CURSO CLÍNICO RECIDIVANTE
3.1.2.2.1.2.1
UAR
Cerca de 80% dos pacientes com UAR, desenvolvem as recorrências antes dos 30 anos de idade. O aparecimento dos primeiros sintomas após essa idade geralmente é indicativo de que fatores sistêmicos estejam gerando a condição (SCULLY et al, 2003). 3.1.2.2.1.2.1.1
MÚLTIPLAS UAR E DOENÇA CELÍACA (DC)
Múltiplas lesões de UAR estão fortemente associadas a doenças sistêmicas gastrointestinais, principalmente que causam deficiência nutricional de ferro, ácido fólico e vitaminas B1, B2, B6 e B12 (FRAIHA et al, 2002; GUIMARÃES et al, 2005; PEREIRA et al, 2006). Um tratamento bem sucedido de UAR depende de um diagnóstico preciso, sendo de fundamental importância, a investigação de condições associadas a essas alterações (FRAIHA et al, 2002). Condições sistêmicas como doença celíaca (DC), doença da imunodeficiência humana (AIDS) – citadas nesse trabalho, entre outras desordens podem estar associadas ao aparecimento de UAR (FRAIHA et al, 2002; FAVARO et al, 2005; ZALTMAN et al, 2010; ERTEKIN et al, 2012). A DC representa a doença intestinal mais comum em populações brancas, tendo como importante manifestação as UAR menores. Como a cavidade bucal é um local de fácil exame, as UAR podem ser uma importante pista clínica para o diagnóstico da DC. Para realização do
99
diagnóstico, pode-se realizar o exame sorológico de detecção de anticorpo antiendomísio (EMA), reagente nos casos de DC. Podem ser realizados exames que detectam autoanticorpos que contribuem para o raciocínio diagnóstico: antitransglutaminase tecidual (anti-tTG), antigliadina (AGA) e antirreticulina (ARA). EMA e anti-tTG são considerados patognomônicos para DC. O critério definitivo para diagnóstico, no entanto, de DC é a resolução dos sintomas e o desaparecimento de autoanticorpos na vigência de dieta com restrição ao glúten (ERTEKIN et al, 2012; SOARES et al, 2012). 3.1.2.2.1.2.1.2
MÚLTIPLAS UAR E HIV
Há uma grande prevalência de lesões bucais em pacientes infectados pelo HIV. Episódios severos de UAR, geralmente manifestados pela primeira vez após a infecção, podem ser observados nesses pacientes. Apresentam-se em suas três formas: menor, maior e herpetiforme, localizando-se preferencialmente em língua, lojas tonsilares e palato mole. Pacientes que estejam no estágio clínico de AIDS apresentam maior número de UAR durante os surtos, chegando a uma média de 8 lesões por episódio, contra 2 de pacientes apenas soropositivos. Geralmente os pacientes com UAR maiores apresentaram menor contagem de células T CD4+ (MIZIARA et al, 2005; JUANES et al, 2008). Para Juanes et al (2008), na maioria dos casos, os pacientes relatam não lembrar de episódios de UAR antes da infecção pelo HIV. Para Miziara et al (2005), no entanto, muitos pacientes soropositivos que relatam episódios de UAR, apresentaram episódios recorrentes das úlceras na infância, que regrediram na vida adulta, voltando a manifestarem-se após a infecção pelo vírus (SCULLY et al, 2003; MIZIARA et al, 2005; JUANES et al, 2008). Miziara et al (2005), em um estudo, concluiu que os três tipos de UAR podem ser encontrados em pacientes soropositivos, porém 45,15% dos pacientes apresentaram UAR dos tipos maior e herpetiforme. MacPhail et al (1991) apud Miziara et al (2005) observou que 66% das UAR eram desses dois tipos (MIZIARA et al, 2005). Para Favaro (2005), a presença de cicatriz em local onde houve previamente úlcera é patognomônico de UAR maiores (FAVARO et al, 2005;). Para Juanes et al (2008), o número de lesões por episódio está diretamente relacionado à imunossupressão, sendo cada vez mais exacerbados com o aumento da severidade da doença AIDS (JUANES et al, 2008).
100
A confirmação da infecção pode ser realizada pela cultura viral ou pela detecção de antígenos e anticorpos para o HIV (NEVILLE et al, 2009). O instrumento padrão de triagem do HIV consiste, inicialmente, no Ensaio Imunoenzimático (ELISA), um teste imunológico de rastreamento que detecta anticorpos anti-HIV-1 e anti-HIV-2. Esse teste, no entanto, pode apresentar resultados falso-positivos ou reações cruzadas, sendo indicado que seja repetido. Quando o teste ELISA der positivo por duas vezes, um exame confirmatório deve ser realizado. Utiliza-se então o Western Blot (WB), considerado padrão-ouro para o diagnóstico de HIV, com especificidade > 99% (NEVILLE et al, 2009; SOARES et al, 2012). 3.1.2.2.1.2.1.3
MÚLTIPLAS UAR RELACIONADAS À ANEMIA POR DEFICIÊNCIA DE FERRO
A anemia por deficiência de ferro é a anemia mais comum, afetando cerca de 30% da população mundial. Um estudo realizado por Pinski et al (2002) apud Guimarães et al (2005), concluiu que UAR podem estar relacionadas a deficiência de ferro, entre outros fatores nutricionais (BARRONS et al, 2001; SCULLY et al, 2003; GUIMARÃES et al, 2005; FEMIANO et al, 2007; SILVA et al, 2011). A importância e o papel que essa deficiência tem no desenvolvimento das UAR, no entanto, ainda não são bem conhecidos (BURGAN et al, 2006). Um estudo realizado nos EUA, no entanto, não encontrou relação entre o aparecimento de UAR e deficiências de ferro e ácido fólico nos indivíduos avaliados (FIELD; ALAN, 2003). A avaliação diagnóstica e terapêutica da anemia por deficiência de ferro pode ser realizada a partir do eritrograma do paciente. Nesse exame são analisados: contagem de eritrócitos (células vermelhas), determinação do hematócrito (Ht) e determinação da hemoglobina (Hb). Quando há anemia por deficiência de ferro, o valor das três contagens estará diminuído (SOARES et al, 2012). 3.1.2.2.1.2.2
ULCERAÇÕES MÚLTIPLAS RELACIONADAS AO HERPES SIMPLES
A recidiva da infecção pelo HSV-1 caracteriza-se pela formação de vesículas localizadas principalmente em região perilabial. As vesículas tem de 1 a 3 mm de diâmetro, com tamanho do aglomerado variando de 1 a 2 cm. Lesões maiores geralmente estão associadas a
101
indivíduos imunossuprimidos, com período menor entre as recorrências. As vesículas intrabucais do HSV-1 rapidamente rompem-se formando úlceras e localizam-se geralmente em palato duro e gengivas. As UAR, em comparação às lesões de herpes simples recorrente, geralmente são maiores e mais espalhadas pela cavidade bucal (GREENBERG et al, 2008). 3.1.2.2.2
ÚLCERAS MÚLTIPLAS
3.1.2.2.2.1
3.1.2.2.2.1.1
ÚLCERAS MÚLTIPLAS DE CURSO CLÍNICO CRÔNICO ÚLCERAS MÚLTIPLAS RELACIONADAS AO PÊNFIGO VULGAR
Por ser uma condição sistêmica bastante grave e poder acometer múltiplos sítios seriamente, é importante que seja realizado um diagnóstico precoce do PV. O aparecimento de lesões bucais antecede a manifestação sistêmica, tornando o diagnóstico de lesões bucais uma importante ferramenta para que o tratamento seja instituído precocemente (BERNABÉ et al, 2005; SCULLY et al, 2009; FIRMINETE et al, 2009; NEVILLE et al, 2009; ARMOMINO et al, 2010). As lesões bucais aparecem como bolhas clássicas, sem halo eritematoso. Porém, pelo fino teto intraepitelial, raramente são vistas. Geralmente são encontradas úlceras rasas, com limites irregulares, com margens amolecidas, com presença de sintomatologia dolorosa intensa. Geralmente localizam-se em palato mole, gengivas, lábio inferior e mucosa bucal (LASKARIS et al, 2004; BERNABÉ et al, 2005; GREENBERG et al, 2008; SHAMIM et al, 2008; PRADEEP et al, 2009; FIRMINETE et al, 2009; SCULLY et al, 2009). A remissão ocorre apenas mediante tratamento local ou sistêmico com corticóides (NEVILLE et al, 2009; SCULLY et al, 2009). O diagnóstico é baseado na análise de um conjunto de fatores: na história e exame clínicos, nas características histopatológicas e na investigação imunológica. Uma técnica semiotécnica denominada “Sinal de Nikolski” é bastante utilizada, que consiste na fricção do epitélio nas proximidades de uma lesão já existente. O sinal é considerado positivo, quando houver a formação de uma bolha, indicativo da doença pênfigo. Esse sinal, entretanto, não é patognomônico do PV, sendo observado na maioria das condições vesículo-bolhosas (SCULLY;
102
CHACALLOMBE, 2002; BERNABÉ et al, 2005; ARMOMINO et al, 2010; CARVALHO et al, 2011). O diagnóstico final do PV na cavidade bucal deve ser baseado nas características clínicas, imunológicas e histopatológicas. É firmado no exame histopatológico, que mostra a presença de bolhas acantolíticas, intraepiteliais, logo acima da camada de células basais (MIZIARA et al, 2003; BERNABÉ et al, 2005; ARMOMINO et al, 2010). O diagnóstico pode ser também baseado na técnica de imunofluorescência direta, que revelará a presença de anticorpo IgG ou IgM e de componentes do sistema complemento nos espaços intercelulares da epiderme (BERNABÉ et al, 2005; PRADEEP et al, 2009). Pode ser bastante difícil determinar o diagnóstico final de uma doença vesículo-bolhosa sem uma investigação detalhada e aprofundada, sendo muitas vezes necessária uma equipe multidisciplinar para realizá-lo, com interação entre cirurgiões-dentistas, otorrinolaringologistas, dermatologistas entre outros profissionais (MIZIARA et al, 2003). O prognóstico do PV é diretamente relacionado ao tempo que é levado para realização do diagnóstico da doença. Sabese que quanto mais rápido acontecer, antes será dado início ao tratamento e, consequentemente, maiores serão as chances de recuperação e controle. É imperativo, portanto, o diagnóstico precoce da doença, sendo de fundamental importância que o cirurgião-dentista identifique as primeiras manifestações que são, de maneira geral, lesões bucais (SCULLY; CHACALLOMBE, 2002; BERNABÉ et al, 2005; ARMOMINO et al, 2010). 3.1.2.2.2.1.2
ÚLCERAS MÚLTIPLAS RELACIONADAS AO PENFIGÓIDE CICATRICIAL
Úlceras bucais decorrentes do penfigóide cicatricial acometem 90% a 100% dos pacientes com a condição. Diferentemente do pênfigo vulgar, que dificilmente se vê a presença de bolhas, vesículas intactas podem ser observadas por não serem tão delgadas. Geralmente manifestam-se como gengivite descamativa, podendo também envolver mucosa alveolar, palato, mucosa jugal, língua e assoalho bucal. As lesões são bastante dolorosas, não havendo relato de sintomas de febre e linfoadenopatia cervical (LASKARIS et al, 2004; BONISSON et al, 2007; FREITAS et al, 2008; GREENBERG et al, 2008; NEVILLE et al, 2009).
103
Assim como no pênfigo vulgar, pode-se utilizar o “Sinal de Nikolsky” para diagnóstico dessas lesões. Por não ser um exame conclusivo, no entanto, a análise histopatológica é um procedimento essencial para estabelecimento do diagnóstico final (BONISSON et al, 2007; LINS et al, 2009). A biópsia da mucosa perilesional exibe separação entre o epitélio e o tecido conjuntivo subjacente, com presença de um leve infiltrado inflamatório crônico (NEVILLE et al, 2009). O diagnóstico precoce pode prevenir complicações, tendo em vista que há o risco de envolvimento sistêmico se não tratado no início da doença. Pesquisas indicam que 25% dos pacientes com lesões bucais, quando não tratados previamente, podem desenvolver lesões oculares. Dados epidemiológicos apontam que a doença causa cegueira em cerca de 15% dos pacientes portadores. Por esse motivo, é essencial que o cirurgião-dentista identifique lesões de penfigóide cicatricial ainda nas manifestações mais precoces (BONISSON et al, 2007; FREITAS et al, 2008; GREENBERG et al, 2008; LINS et al, 2009; CARVALHO et al, 2011). 3.1.2.2.2.1.3
ÚLCERAS MÚLTIPLAS RELACIONADAS AO LÍQUEN PLANO EROSIVO
Em casos de manifestações clássicas do líquen plano bucal (LPO), o diagnóstico pode ser realizado com base somente nas características clínicas da lesão, podendo ser confirmado com a realização de exame histopatológico. As manifestações clínicas dessa lesão, no entanto, podem ser muito variadas (CANTO et al, 2010; HERNANDEZ et al, 2011). As lesões de LPO são persistentes, podendo sofrer períodos de exacerbação, geralmente relacionadas a períodos de estresse, ansiedade ou episódios de trauma mecânico e remissão. As lesões típicas do LPO caracterizam-se por pápulas brancas pequenas, que geralmente se coalescem e formam finas linhas (estrias de Wickham) ou uma rede de linhas que podem passar por melhora ou piora em semanas ou meses. Uma característica bastante importante é que, quando presentes, aparecem simetricamente geralmente localizadas em mucosa jugal (GREENBERG et al, 2008; MARTINS et al, 2008; CANTO et al, 2010; CASTELS et al, 2010; HERNÁNDEZ et al, 2011). Lesões da forma erosiva causam bastante dor e desconforto, pois se apresentam como úlceras irregulares, cobertas por uma pseudomembrana. A lesão costuma ser circundada por finas estrias queratinizadas ou rendilhadas. Localizam-se normalmente em mucosa
104
jugal, língua e gengivas. Lesões cutâneas, genitais, ungueais, actínicas, hipertróficas e vesículo-bolhosas também podem ser encontradas concomitantemente às bucais, sendo uma importante chave para a realização do diagnóstico (LASKARIS et al, 2004;REGEZI et al, 2008; SCULLY et al, 2008; NEVILLE et al, 2009; CANTO et al, 2010; CASTELS et al, 2010; HERNÁNDEZ et al, 2011; HAKKOU et al, 2012). A gengivite descamativa pode estar presente no LPO, porém não é uma característica patognomônica, pois também pode estar presente em outras doenças dermatológicas como o pênfigo e o penfigóide (OCZKO; KOZLOWSKI, 2011). O diagnóstico final dessas lesões pode ser realizado, senão pelas características clínicas, por métodos complementares. A realização de um exame histológico minucioso pode excluir a possibilidade de uma displasia ou carcinoma. Características histopatológicas essenciais para o diagnóstico conclusivo de LPO são (NEVILLE et al, 2009; CANTO et al, 2010): Presença de áreas de hiperqueratose; Degeneração por liquefação ou necrose da camada basal; Densa faixa subepitelial de linfócitos. Um fator ainda controverso na literatura é a característica prémaligna da lesão, principalmente na forma erosiva. Alguns autores consideram lesões de LPO uma lesão potencialmente malignizável. Outros, no entanto, acreditam que essas lesões de LPO que supostamente evoluem para neoplasias são, na verdade, lesões displásicas mal-diagnosticadas (CANTO et al, 2010; OCZKO; KOZLOWSKI, 2011). IMPORTÂNCIA DO DIAGNÓSTICO ULCERATIVAS DA CAVIDADE BUCAL
DE
LESÕES
Lesões ulcerativas da cavidade bucal podem apresentar diversas origens: desde simples lesões traumáticas, de fácil visualização, diagnóstico e manejo até complexas manifestações das mais variadas desordens sistêmicas, nem sempre correlacionadas e corretamente diagnosticadas. Nesse contexto, é importante lembrar que o aparecimento de tais lesões na cavidade bucal, apesar de frequente, não deve ser desprezado, pois muitas doenças sistêmicas graves manifestamse primeiramente a partir de lesões intrabucais. Portanto, é papel do cirurgião-dentista investigar e participar do processo de diagnóstico
105
dessas lesões, principalmente nos estágios iniciais da doença, para que o tratamento seja o menos agressivo e o prognóstico o melhor possível.
106
4
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Várias condições sistêmicas possuem a capacidade de causar lesões na cavidade bucal. Dentre essas, estão as lesões ulceradas que, muitas vezes, pelo carater clínico inespecífico, mostram-se como verdadeiros desafios diagnósticos ao clínico. Por isso, é de extrema importancia que cirurgiões-dentistas realizem uma anamnese minuciosa e conheçam os sinais bucais das mais variadas condições sistemicas. Uma investigação minuciosa deve ser realizada em qualquer paciente que desenvolva lesões ulceradas onde o fator causal trauma for excluido. Sendo assim, a fim de gerir adequadamente os pacientes, todos os que apresentarem lesões ulceradas por períodos superiores a 3 semanas, onde a causa não for evidente, devem ter seu histórico de saúde revisados, para que assim se possa encontrar o fator etiologico causal. Muitas vezes, quando a causa não é óbvia, para se alcançar um correto diagnóstico e tratamento, é necessário que ocorra diálogo e uma abordagem interdisciplinar entre médicos e cirurgiões-dentistas. O diagnóstico precoce das lesões ulceradas da cavidade bucal pode muitas vezes ser decisivo no sucesso do tratamento. Como um exemplo claro dessa situação, tem-se as lesões neoplasicas malignas, que quando identificadas precocemente, levam o paciente a uma taxa de cura alta. Por ser o profissional que atua diretamente na cavidade bucal, fica evidente a responsabilidade que o cirurgião-dentista possui sobre a saúde geral de seus pacientes.
107
108
5
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABDOLLAHI, M.; RAHIMI, R.; RADFAR, M. CURRENT OPINION ON DRUG-INDUCED BUCAL REACTIONS: A COMPREHENSIVE REVIEW. J Contemp Dent Pract, v. 9, n. 3, p. 1–15, 2008. AMORMINO, S.A.; BARBOSA, A.A. PÊNFIGO VULGAR: REVISÃO DE LITERATURA E RELATO DE CASO CLÍNICO. Revista de Periodontia, Belo Horizonte, v. 20, n. 2, p.47-52, jun. 2010. ANASTÁCIO, V.M., et al. PARACOCCIDIOIDOMICOSE: CORRELAÇÃO ENTRE ACHADOS CLÍNICOS ELABORATORIAIS NA REGIÃO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO. Arq Ciênc Saúde, São José do Rio Preto, v. 14, n. 3, p.181185, set. 2007. ATTILI, V., et al. RELATIONSHIP BETWEEN SKIN DISEASES AND CD4 CELL COUNTS IN A HOSPITAL-BASED COHORT OF HIV-INFECTED ADULTS IN NORTH INDIA. Journal, Indian Academy Of Clinical Medicine, Varanasi, v. 9, n. 1, p.20-25, mar. 2008. AVELLEIRA, J.C.; BOTTINO, G. SÍFILIS: DIAGNÓSTICO, TRATAMENTO E CONTROLE. Anais Brasileiros de Dermatologia, Rio De Janeiro, v. 81, n. 2, p.111-126, 2006. AZAÑERO, W.D., et al. REPORTE DE CASO: INFECCIÓN DE LA MUCOSA BUCAL POR COXSACKIE VIRUS: ENFERMEDAD DE BOCA MANO PIE. Rev Estomatol Herediana, Lima, v. 17, n. 1, p.35-39, 20 dez. 2006. BALFOUR, H.H., et al. HERPES GROUP VIRUSES AND HIV INFECTION. The Journal Of Infectious Diseases, Minneapolis, v. 9, n. 4, p.20-24, dez. 2003. BARRONS, R., et al. CLINICAL REVIEW: TREATMENT STRATEGIES FOR RECURRENT BUCAL APHTHOUS ULCERS. American Society Of Health-system Pharmacists, Los Angeles, v. 58, p.41-50, jan. 2001.
109
BERNABÉ D.G., et al. TREATMENT OF BUCAL PEMPHIGUS VULGARIS WITH TOPIC AND SISTEMIC CORTICOSTEROID ASSOCIATED WITH DAPSONE AND PENTOXIFYLLINE. Rev Odontol UNESP, v. 34, n. 1, p. 49-55, 2005. BODHADE, A.S., et al. BUCAL MANIFESTATIONS OF HIV INFECTION AND THEIR CORRELATION WITH CD4 COUNT. Journal Of Bucal Science, Maharashtra, v. 53, n. 2, p.203211, 5 abr. 2011. BORTOLUZZI, M.C., et al. MANIFESTAÇÕES BUCAIS DA PARACOCCIDIOMICOSE: RELATO DE DOIS CASOS. Rev. Clín. Pesq. Odontol., Curitiba, v. 4, n. 1, p.53-58, abr. 2008. BROOME, C. RECOMMENDATIONS AND REPORTS: RECOMMENDATIONS TO PREVENT AND CONTROL IRON DEFICIENCY IN THE UNITED STATES. Centers For Disease Control And Prevention: morbity and mortality weekly report, Atlanta, v. 47, n. -3, p.1-27, 3 abr. 1998. BURGAN, S.Z., et al. HEMATOLOGIC STATUS IN PATIENTS WITH RECURRENT APHTHOUS STOMATITIS IN JORDAN. Saudi Med J, Jordan, v. 27, n. 3, p.381-384, jan. 2006. CANÇADO, R.D.; CHIATTONE, C.S. ANEMIA FERROPÊNICA NO ADULTO: CAUSAS, DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO. Revista Brasileira de Hematologia e Hemoterapia, São Paulo, v. 32, n. 3, p.240-246, 2010. CANTO, A. M., et al. LÍQUEN PLANO BUCAL (LPO): DIAGNÓSTICO CLÍNICO E COMPLEMENTAR. Anais Brasileiros de Dermatologia, São Paulo, v. 85, n. 5, p.669-675, 2010. CARVALHO, C.P., et al. ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO DAS DOENÇAS DERMATOLÓGICAS IMUNOLOGICAMENTE MEDIADAS NA CAVIDADE BUCAL. Anais Brasileiros de Dermatologia, Natal, v. 86, n. 5, p.905-909, 2011. CARVALHO E.S.; MARTINS, R.M. VARICELA: ASPECTOS CLÍNICOS E PREVENÇÃO. Jornal de Pediatria, São Paulo, v. 75, n. 1, p.126-134, 1999.
110
CASIMIRO, L.M., et al. LIQUEN PLANO. Med Cutan Iber Lat Am, Valencia, v. 36, n. 5, p.223-231, 2008. CENDRAS, J.; BONNETBLANC, J. M. LICHEN PLAN BUCCAL ÉROSIF EROSIVE BUCAL: EROSIVE BUCAL LICHEN PLANUS. Annales de Dermatologie Et de Vénéréologie, Limoges, p.458-468, 2008. CHEADE, M.F., et al. CARACTERIZAÇÃO DA TUBERCULOSE EM PORTADORES DE HIV/AIDS EM UM SERVIÇO DE REFERÊNCIA DE MATO GROSSO DO SUL. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, Campo Grande, v. 42, n. 2, p.119-125, abr. 2009. CONSOLARO, A; CONSOLARO, M. DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DO HERPES SIMPLES RECORRENTE PERIBUCAL E INTRABUCAL NA PRÁTICA ORTODÔNTICA. R Dental Press Ortodon Ortop Facial, Maringá, v. 14, n. 3, p.16-24, jun. 2009. CURVELO, J.A., et al. ÚLCERAS AFTOSAS RECORRENTES E SUA POSSÍVEL ASSOCIAÇÃO AO ESTRESSE. R. Ci. Méd. Biol., Salvador, v. 7, n. 1, p.67-75, abr. 2008. DAMLE, S. G., et al. EVALUATION OF BUCAL HEALTH STATUS AS AN INDICATOR OF DISEASE PROGRESSION IN HIV POSITIVE CHILDREN. Pesq Bras Odontoped Clin Integr, Paraíba, v. 10, n. 2, p.151-156, ago. 2010. FÁVARO, D.; MARTINS, G. ULCERAÇÃO AFTOSA RECORRENTE EM CRIANÇAS: REVISÃO: DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL, FATORES SISTÊMICOS E TRATAMENTO. Rev. de Clín. Pesq. Odontol, Paranavaí, v. 1, n. 3, p.43-45, mar. 2005. FEMIANO, F., et al. GUIDELINES FOR DIAGNOSIS AND MANAGEMENT OF APHTHOUS STOMATITIS. The Pediatric Infectious Disease Journal, Nápoles, v. 26, n. 7, p.728-732, 23 mar. 2007. FERGUSON, M.M., et al., COELIAC DISEASE ASSOCIATED WITH RECURRENT APHTHAE. Gut, v.21, n.3, p. 223-226, 1980.
111
FERREIRA, F.A., et al. MANIFESTAÇÕES BUCAIS DOS PÊNFIGOS VULGAR E BOLHOSO. Odontologia. Clín. Científic, Recife, v. 8, n. 4, p.293-298, dez. 2009. FERREIRA, D.C., et al. RECURRENT HERPES SIMPLEX INFECTIONS: LASER THERAPY AS A POTENTIAL TOOL FOR LONG-TERM SUCCESSFUL TREATMENT: HERPES SIMPLEX RECORRENTE: LASER TERAPIA COMO MÉTODO ALTERNATIVO PARA TRATAMENTO A LONGO PRAZO. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, Vitória, v. 3, n. 44, p.397-399, jun. 2011. FIQUERÓ, E.A., et al. FREQÜÊNCIA DAS INFECÇÕES PELO HIV-1, RUBÉOLA, SÍFILIS, TOXOPLASMOSE, CITOMEGALOVÍRUS, HERPES SIMPLES, HEPATITE B, HEPATITE C, DOENÇA DE CHAGAS E HTLV I/II EM GESTANTES, DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, Campo Grande, v. 40, n. 2, p.181-187, abr. 2007. FONSECA, B.L., et al. CLÍNICA E TRATAMENTO DAS INFECÇÕES PELOS VÍRUS HERPES SÍMPLEX TIPO 1 E 2. Simpósio: virologia médica ii, Ribeirão Preto, n. , p.147-153, jun. 1999. FRAIHA, P.M., et al. ESTOMATITE AFTOSA RECORRENTE: REVISÃO BIBLIOGRÁFICA. Rev Bras Otorrinolaringol., Rio de Janeiro, v. 68, n. 4, p.571-578, ago. 2002. FREITAS, V.A., et al. PENFIGÓIDE CICATRICIAL NO TRATO AERODIGESTIVO SUPERIOR:: RELATO DE DOIS CASOS. Rev Bras Otorrinolaringol, Belo Horizonte, v. 74, n. 6, p.941-944, 2008. GODDARD, A.F.; MCINTYRE, A.S.; SCOTT, B.B. GUIDELINES FOR THE MANAGEMENT OF IRON DEFICIENCY ANAEMIA. British Society of Gastroenterology. v. 46, n. 3-4, p. IV1-IV5, 2000. GOIATO, M.C., et al. LESÕES ORAIS PROVOCADAS PELO USO DE PRÓTESES REMOVÍVEIS. Pesquisa Brasileira em Odontopediatria e Clínica Integrada, João Pessoa, v. 5, n. 1, p.85-90, 2005.
112
GREENBERG, M.S.; GLICK, M. MEDICINA BUCAL DE BURKET - DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO. 10. ed. Rio de Janeiro: Santos, 2008. GUIMARÃES, G.O., et al. ULCERAÇÕES AFTOSAS RECORRENTES: REVISÃO DE LITERATURA. Constientiae Saúde, São Paulo, v. 4, p.87-95, 2005. GUPTE S.; GUPTA R.; GUPTA R. IRON DEFICIENCY ANEMIA: MANAGEMENT AND PREVENTION IN CHILDREN. Jk Science, Jammu, v. 3, n. 4, p.160-165, dez. 2001. HAKKOU, F.; CHBICHEB, S.; ESSAID, E.; WADY, W. BUCAL LICHEN PLANUS AND HEPATITIS C VIRUS INFECTION: AN EPIDEMIOLOGICAL STUDY OF 149 CASES. Int. J. Odontostomat., v. 6, n. 2, p.163-168, 2012. HERNANDÉZ C.V.; CABALLERO, A.; GARCIA, L.B. LIQUEN PLANO EN CAVIDAD BUCAL: REPORTE DE UN CASO CLÍNICO Y REVISIÓN DE LA LITERATURA. Acta Odontológica Venezolana, Caracas, v. 49, n. 4, p.1-10, 2011. JUNQUEIRA, J.J., et al. CITOMEGALOVÍRUS: REVISÃO DOS ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS, CLÍNICOS, DIAGNÓSTICOS E DE TRATAMENTO. Newslab, São Paulo, p.88-104, 2008. LASKARIS, G. ATLAS COLORIDO DE DOENÇAS DA BOCA. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2004. LEÃO, J.C., et al. Review: ULCERATIVE LESIONS OF THE MOUTH: AN UPDATE FOR THE GENERAL MEDICAL PRACTITIONER. Clinics, Londres, v. 6, n. 62, p.769-780, 27 ago. 2007. LIMA, A.S., et al. ARTIGO INÉDITO: TRATAMENTO DAS ULCERAÇÕES TRAUMÁTICAS BUCAIS CAUSADAS POR APARELHOS ORTODÔNTICOS. R Dental Press Ortodon Ortop Facial, Maringá, v. 10, n. 5, p.30-36, out. 2005. LIMA, L.M., et al. PREVALÊNCIA E FATORES DE RISCO PARA O DESENVOLVIMENTO DE ESTOMATITE AFTOSA
113
RECORRENTE. Rev. Cir. Traumatol. Bucomaxilofac., Pernambuco, v. 10, n. 2, p.61-66, jun. 2010. LINS, S.A., et al. PENGIFÓIDE BENIGNO DE MUCOSA. Salusvita, Bauru, v. 28, n. 2, p. 205-211, 2009. LITTLE, J.W., et al. MANEJO ODONTOLÓGICO DO PACIENTE CLINICAMENTE COMPROMETIDO. 7. ed. Rio De Janeiro: Elsevier, 2008. LOURENÇO, A.G.; FIQUEIREDO, L.T. BUCAL LESIONS IN HIV INFECTED INDIVIDUALS FROM RIBEIRÃO PRETO, BRAZIL. Med Bucal Patol Bucal Cir Bucal, Ribeirão Preto, v. 13, n. 5, p.281-286, 1 maio 2008. MAROTTI, J., et al. TRATAMENTO DO HERPES LABIAL PELA TERAPIA FOTODINÂMICA. Rev Assoc Paul Cir Dent, São Paulo, v. 5, n. 62, p.370-373, 2008. MARTINS, R., et al. LÍQUEN PLANO BUCAL. Revista Sulbrasileira de Odontologia, Joinville, v. 5, n. 2, p.64-68, 2008. MENDES, M. L., et al. Artigo de Revisão: AVITAMINOSES E SUAS MANIFESTAÇÕES BUCAIS. International Journal Of Dentistry, Recife, v. 2, n. 2, p.257-261, dez. 2003. MIZIARA, I.D., et al. ACOMETIMENTO BUCAL NO PÊNFIGO VULGAR. Rev Bras Otorrinolaringol., São Paulo, v. 69, n. 3, p.327331, jun. 2003. MIZIARA, I.D., et al. AIDS E ESTOMATITE AFTÓIDE RECIDIVANTE. Rev Bras Otorrinolaringol., Camaragibe, v. 71, n. 4, p.517-520, 2005. MONEY, D., et al. GUIDELINES FOR THE MANAGEMENT OF HERPES SIMPLEX VIRUS IN PREGNANCY. J Obstet Gynaecol Can, Vancover, v. 6, n. 208, p.514-519, jun. 2008. MUNIZ, M.S., et al. PARACOCCIDIOIDOMICOSE PULMONAR: ASPECTOS NA TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA DE
114
ALTA RESOLUÇÃO. Radiol Bras, Rio de Janeiro, v. 35, n. 3, p.147154, 2002. NEVILLE, B.W., et al. PATOLOGIA BUCAL MAXILOFACIAL. 3. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.
E
OWENS, S.R.; GREENSON, J.K. THE PATHOLOGY OF MALABSORPTION: CURRENT CONCEPTS. Histopathology, v.50, n.1, p. 64-82, 2007. PEREIRA, K.M.A., et al. RECURRENT APHTHOUS ULCERATION: A REVIEW OF THE PRESENT ASPECTS. Rev Odontol UNESP, v. 35, n. 1, p. 61-67, 2006. PRADEEP, A.R., et al. PEMPHIGUS VULGARIS ASSOCIATED WITH SIGNIFICANT PERIODONTAL FINDINGS:: A CASE REPORT. International Journal Of Medicine And Medical Sciences, Karnataka, v. 1, n. 8, p.297-301, ago. 2009. RADWAN-OCZKO, M.; KOZLOWSKI, Z. BUCAL LICHEN PLANUS LESION ASSESSMENT IN RELATION TO GENERAL HEALTH AND BUCAL SYMPTOMS. Adv Clin Exp Med, Polônia, v. 20, n. 4, p.495-501, 2011. RASHID, M., et al. BUCAL MANIFESTATIONS OF CELIAC DISEASE: A CLINICAL GUIDE FOR DENTISTS. J Mich Dent Assoc, v. 93 n. 10, p. 42-46, 2011. REGEZI, J.A.; SCIUBBA, J.J.; POGREL, M.A. ATLAS DE PATOLOGIA BUCAL E MAXILOFACIAL. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002. REGEZI, J.A.; SCIUBBA, J.J; JORDAN, R.C.K. PATOLOGIA BUCAL: CORRELAÇÕES CLINICOPATOLÓGICAS. 5. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008. RUAN, F., et al. RISK FACTORS FOR HAND, FOOT, AND MOUTH DISEASE AND HERPANGINA AND THE PREVENTIVE EFFECT OF HAND-WASHING. American Academy Of Pediatrics, Atlanta, p.898-904, jan. 2011.
115
PÉREZ-SALCEDO, L.; BASCONES A.M. TUMORES BENIGNOS DE LA MUCOSA BUCAL: BENIGN TUMORS IN BUCAL CAVITY. Avances En Odontoestomatología, Madri, v. 26, n. 1, p.1118, 2010. SANTANA, L.R., et al. TESTE VDRL PARA O DIAGNÓSTICO DA SÍFILIS.: AVALIAÇÃO DOS RESULTADOS EM UMA UNIDADE DE ATENÇÃO PRIMÁRIA DE SAÚDE. RBAC, Fortaleza, v. 38, n. 2, p.71-73, 2006. SANTOS, J.S., et al. A COINFECÇÃO TUBERCULOSE E HIV: UM IMPORTANTE DESAFIO: ARTIGO DE REVISÃO. RBAC, Santa Maria, v. 41, n. 3, p.209-215, 2009. SANTOS, C.F., et al. PNEUMONIA A VARICELLA ZOSTER. Revista Portuguesa de Pneumologia, Viseu, v. 16, n. 3, p.493-505, jun. 2010. SCHEINEDER, L. C.; SCHEINEDER A. E. DIAGNOSIS OF BUCAL ULCERS. Journal Of Medical Case Reports, New Jersey, v. 65, n. 56, p.383-387, out. 1998. SCULLY, C., et al. THE DIAGNOSIS AND MANAGEMENT OF RECURR ENT APHTHOUS STOMATITITS: A CONSENSUS APPROACH. Jada, Chicago, v. 134, p. 200-207, 2003. SCULLY, C.; SHOTTS, R. ABC OF BUCAL HEALTH. MOUTH ULCERS AND OTHER CAUSES OF OROFACIAL SORENESS AND PAIN. BMJ, v. 321, n. 7254, p. 162-5, 2000. SCULLY, C. MEDICINA BUCAL E MAXILOFACIAL: BASES DO DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO. 2. ed. São Paulo: Elsevier, 2009. SEISCENTO, M. TUBERCULOSE EM SITUAÇÕES ESPECIAIS: HIV, DIABETES MELLITUS E INSUFICIÊNCIA RENAL. Pulmão RJ, São Paulo, v. 21, n. 1, p.23-26, 2012. SHAKERI, R., et al. GLUTEN SENSITIVITY ENTEROPATHY IN PATIENTS WITH RECURRENT APHTHOUS STOMATITIS. BMC Gastroenterol, v. 9, p. 44, 2009.
116
SHAMIM, T., et al. PEMPHIGUS VULGARIS IN BUCAL CAVITY: CLINICAL ANALYSIS OF 71 CASES. Med Bucal Patol Bucal Cir Bucal. v. 13, n. 10, p. E622 – 666, 2008. SHARMA, B., et al. OROCUTANEOUS MANIFESTATIONS AS MARKERS OF DISEASE PROGRESSION IN HIV INFECTION IN INDIAN SETTING. Mjafi, Jharkhan, v. 60, n. 3, p.239-243, 2004. SHIN, J. U., et al. A CASE OF HAND-FOOT-MOUTH DISEASE IN AN IMMUNOCOMPETENT ADULT. Ann Dermatol, Korea, v. 22, n. 2, p.216-218, 2010. SIRCUS, W., et al. THE MANAGEMENT OF RECURRENT APHTHOUS STOMATITIS. British Medical Journal, Londres, p.804-806, 24 out. 1959. SOARES, J., et al. MÉTODOS DIAGNÓSTICOS: CONSULTA RÁPIDA. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2012. SOUZA, L. B., et al. MANIFESTAÇÕES ORAIS EM PACIENTES COM AIDS EM UMA POPULAÇÃO BRASILEIRA. Pesq Odont Bras, v. 14, n. 1, p. 79-85, 2000. STEVENSON, M., et al. HIV-1 PATHOGENESIS. Nature Medicine, Massachussets, v. 9, n. 7, p.853-860, 2003. SUGERMAN, P.B; SAVAGE, N.W. BUCAL LICHEN PLANUS:: CAUSES, DIAGNOSIS AND MANAGEMENT. Australian Dental Journal, Boston, v. 47, n. 4, p. 290-297, 2002. TAIWO, O. O.; HASSAN, Z. HIV-RELATED BUCAL LESIONS AS MARKERS OF IMMUNOSUPPRESSION IN HIV SEROPOSITIVE NIGERIAN PATIENTS. Journal Of Medicine And Medical Sciences, Nigeria, v. 1, n. 5, p.166-170, 2010. TOCHE, P., et al. ÚLCERAS BUCALES RECURRENTES:: CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS Y DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL. Rev Chil Infect, Chile, v. 24, n. 3, p. 215-219, 2007.
117
TOLENTINO, E. S., et al. MANIFESTAÇÕES BUCAIS DA PARACOCCIDIOIDOMICOSE: CONSIDERAÇÕES GERAIS E RELATO DE CASO. Rfo, Bauru, v. 15, n. 1, p.71-76, 2010. TORRENTE-CASTELLS, E., et al. CLINICAL FEATURES OF BUCAL LICHEN PLANUS.: A RETROSPECTIVE STUDY OF 65 CASES. Journal Section: Bucal Medicine And Pathology, Barcelona, v. 15, n. 5, p. 685-690, 2010. WILHEMSEM, N.S.W., et al. CORRELATION BETWEEN HISTOCOMPATIBILITY ANTIGENS AND RECURRENT APHTHOUS STOMATITIS IN THE BRAZILIAN POPULATION. Brazilian Journal Of Otorhinolaryngology, São Paulo, v. 75, n. 3, p.426-431, 2009. YAMAMOTO, G.R.; PORTINHO, C.P. ARTIGO DE REVISÃO: SISTEMA COMPLEMENTO: ATIVAÇÃO, REGULAÇÃO E DEFICIÊNCIAS CONGÊNITAS ADQUIRIDAS. Rev Ass Med Brasil, Porto Alegre, v. 47, n. 1, p.41-51, 2001. YOUNG-NA, S., et al. A CASE OF VARICELLA COMBINED WITH HAND-FOOT-MOUTH DISEASE IN A HEALTHY CHILD. Ann Dermatol, Korea, v. 21, n. 1, p.98-101, 2009.